36 minutos para a história do pontificado

Em entrevista televisiva, Bento XVI fala do papel da Igreja no mundo contemporâneo: dos jovens ao lugar da mulher, do ecumenismo à moral sexual, o Papa quer um Catolicismo que se afirme pela positiva Os 36 minutos da entrevista que Bento XVI concedeu aos canais alemães Bayerischer Rundfunk, ZDF, Deutsche Welle e à Rádio Vaticano entram directamente para a história deste pontificado. O Papa revela qual é a Igreja que quer para o mundo de hoje e deixa claro que, em todas as questões – dos jovens ao lugar da mulher, do ecumenismo à moral sexual -, é necessário apresentar um Catolicismo que se afirme pela positiva e não como um conjunto de proibições. Gravada no passado dia 5 de Agosto, em Castel Gandolfo, a entrevista foi transmitida este Domingo, menos de um mês da visita que o Papa efectuará à sua Baviera natal, de 9 a 14 de Setembro. Bento XVI mostra-se consciente da complexidade e das dificuldades que marcam a relação entre a Igreja e a sociedade contemporânea, mas não perde a confiança na capacidade dos católicos em abandonar uma posição que os entrevistadores definiram como “defensiva”. “Temos a tarefa de colocar em relevo aquilo que nós queremos, de positivo. E isso devemos fazê-lo, antes de tudo no diálogo com as culturas e com as religiões”, aponta o Papa. Uma das frases fortes da entrevista refere que “O Cristianismo, o Catolicismo não é um conjunto de proibições, mas uma opção positiva”, com Bento XVI a lamentar que essa consciência, hoje, tenha desaparecido quase completamente. Essa visão positiva não impede que a Igreja fale do que não quer, mesmo em âmbitos delicados como a família e o matrimónio. Para o Papa, o casamento entre o homem e a mulher “não é uma invenção católica” e está presente em todas as culturas; quanto ao aborto, é referido que “a pessoa humana tem início no seio materno e permanece pessoa humana, até ao seu último suspiro”. Já sobre a luta contra a SIDA – campo em que a Igreja tem sido duramente criticada ao longo dos anos por causa das suas posições quanto ao uso do preservativo – o Papa refere que “a questão fundamental, se quisermos progredir nesse campo, chama-se educação, formação”. Especificamente sobre o continente africano, Bento XVI lembra que ali “se faz muito para que as diversas dimensões da formação possam integrar-se e, assim, se torne possível superar a violência e também as epidemias, entre as quais precisamos de incluir também a malária e a tuberculose”. Mulheres e ecumenismo Num olhar para várias questões da vida interna da Igreja, o Papa sublinhou a “força espiritual das mulheres”, mas admite nenhuma hipótese relativamente à ordenação sacerdotal das mulheres. “A nossa fé, a constituição do Colégio dos Apóstolos nos obriga-nos e não nos permite conferir a ordenação sacerdotal às mulheres”, explica. Bento XVI aponta que “não se pode pensar que, na Igreja, a única possibilidade de desempenhar um papel de relevo seja a de ser sacerdote”. “Creio que as próprias mulheres, com o seu dinamismo e a sua força, com a sua preponderância e com a sua ‘força espiritual’ saberão conquistar o seu espaço. E nós devemos colocar-nos na escuta de Deus, para não sermos nós a opormo-nos a Ele, mas pelo contrário, a alegrarmo-nos pelo facto de o elemento feminino alcançar, na Igreja, o lugar operativo que lhe cabe, a começar pela Mãe de Deus e Maria Madalena”, indicou. O ecumenismo é outra das questões presentes na conversa, em que Bento XVI assegura ser possível encontrar um terreno de convergência nas “grandes orientações éticas”. “A primeira coisa a fazer, nesta sociedade, é preocuparmo-nos, todos juntos, por tornar claras as grandes orientações éticas, encontrá-las nós mesmos e traduzi-las, de modo a garantir a coesão ética da sociedade, sem a qual ela não pode realizar os fins da política, que são a justiça para todos, a boa convivência e a paz”, precisou. O Papa, neste contexto, não pode ser “um monarca absoluto”, mas Bento XVI acredita que todos os cristãos sentem “a consciência da necessidade de uma instância unificadora, capaz de criar também a independência das forças políticas e garantir que as ‘cristandades’ não se identifiquem demasiado com as nacionalidades”. A herança de João Paulo II O pontificado de João Paulo II é, para o Papa Ratzinger, um exemplo do que pode ser o Catolicismo no futuro, com a capacidade “atrair a atenção dos homens e reuni-los”. Uma das marcas desse pontificado, as canonizações e beatificações, tem sido muito questionada desde que Bento XVI foi eleito, havendo que critique a suposta “fábrica de Santos” do Vaticano. O actual Papa não foge à questão e confessa que “no início, eu também tinha a ideia de que a grande quantidade de beatificações quase nos esmagava, e que talvez houvesse necessidade de escolher um pouco mais figuras que entrassem mais claramente na nossa consciência”, defendendo a descentralização das beatificações que já foi operada. “Eu creio que as Conferências Episcopais deveriam escolher, deveriam ver quem é apropriado, quem nos diz realmente, alguma coisa; e depois, deveriam tornar mais visíveis essas figuras mais significativas, imprimindo-as na consciência, por meio da catequese e da pregação; talvez até se pudesse mesmo apresentá-las com um filme”, sugere. De Ratzinger a Bento XVI Joseph Ratzinger foi sempre uma figura muito sujeita à exposição mediática e nem sempre particularmente bem-amada. Ao longo dos últimos meses muitos têm afirmado que Bento XVI não é o mesmo Cardeal Ratzinger e o Papa não se intimida: “eu já fui seccionado diversas vezes: o professor do primeiro período e o do período intermediário, o primeiro Cardeal e o sucessivo. Agora, acrescenta-se outra dissecação”. “A minha personalidade fundamental e também a minha visão fundamental cresceram, mas em tudo o que é essencial, permanecem idênticas. Fico feliz pelo facto de, agora, serem percebidos também aspectos que antes não eram tão notados”, adianta. O Papa diz que considera muito importante “ver o aspecto divertido da vida e a sua dimensão alegre”, frisando que mesmo numa missão “cansativa” como aquela para a qual foi escolhida pelos Cardeais da Igreja Católica, em Abril de 2005, “procuro encontrar alegria”. Bento XVI confessa ainda que “não me sinto em condições de agendar muitas viagens longas, mas onde houver possibilidade de dirigir uma mensagem, onde tais viagens responderem a um verdadeiro desejo, ali quero ir, com a ‘dosagem’ que me for possível”. Entrevista na íntegra • Cristianismo é mais do que um conjunto de proibições

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Agência ECCLESIA

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