Historiador e economista recordam 1974 e apontam perspetivas de futuro para Portugal, 38 anos após a revolução que marcou a transição para a democracia
Lisboa, 25 abr 2012 (Ecclesia) – Os principais alicerces da liberdade são as relações humanas, o compromisso com causas comunitárias e a recusa do individualismo, consideram o historiador António Matos Ferreira e o economista Joaquim Cadete.
Assinalando o 38.º aniversário da ‘Revolução dos Cravos”, que a 25 de abril de 1974 desencadeou em Portugal o processo de transição para o regime democrático, o programa ECCLESIA na Antena 1 foi à procura da liberdade a partir da ótica cristã.
“O esforço de nos libertarmos e quebrarmos cadeias não pode ser experimentado fora da relação que temos uns com os outros”, frisa António Matos Ferreira.
O diretor do Centro de Estudos de História Religiosa da Universidade Católica Portuguesa lembra as pessoas “que viveram em liberdade nas experiências mais extremas, como na opressão e na injustiça”.
Em contrapartida há sociedades que “aparentemente não têm constrangimentos” à liberdade mas onde os indivíduos são incapazes de a viver plenamente, dado que ela exige uma consciência pessoal “aberta” e “profunda”.
[[a,d,3079,Emissão 22-04-2012]]“Todo o ser humano é limitado; esta perceção é muito importante para a consciência da liberdade, que não assenta na ideia de que tudo é radicalmente possível mas de que se é capaz de imaginar e viver algo bom, mesmo com as nossas limitações”, aponta.
Para Joaquim Cadete a liberdade no Ocidente “é muito centrada no individualismo”, pelo que é preciso “maior interligação” entre as pessoas que vivem em comunidade e o regresso a um conjunto de “valores e princípios”.
O empresário diz que é necessário acentuar “os deveres associados à liberdade”: “Fomos centrando a liberdade nos direitos adquiridos mas só se pode falar deles se houver a capacidade de continuarem a ser respeitados”.
Após a revolução os portugueses ganharam a “ilusão da conquista da liberdade”, sem perceberem “que tinham perdido imensamente em termos financeiros”, o que conduziu ao pedido de intervenção do Fundo Monetário Internacional, recorda Joaquim Cadete.
A atual sujeição de Portugal ao memorando da ‘troika’, no seguimento da “ilusão da Europa”, sinaliza que a liberdade está relacionada com a economia e a globalização.
António Matos Ferreira salienta que segundo a experiência cristã “a liberdade é interior mas sempre referenciada a algo exterior”: “Isto é muito claro para os cristãos quando afirmam que Jesus é um homem livre. Em muitos aspetos ele foi esmagado pelas circunstâncias mas a sua liberdade residia na relação íntima [com Deus Pai]”.
“Para o crente o amor é mais forte do que a morte, o mal e o pecado. Este é o cerne da liberdade e da relação”, refere.
O historiador frisa que “a liberdade é por vezes uma experiência dolorosa, difícil e contraditória”, mesmo nas comunidades crentes.
“O maior risco é uma autossuficiência dos cristãos, quase considerando que podem prescindir dos outros”, arriscando por isso “ter uma intervenção demasiadamente arrogante”, alerta.
O responsável chama a atenção para o risco de “perda da identidade” do cristianismo, provocado por uma “profunda dicotomia” no interior das comunidades.
“Somos cristãos quando nos reunimos e consideramos que partilhamos os mesmos valores e liturgia, mas temos enorme dificuldade em estarmos presentes no mundo”, conclui.
PRE/RJM