Diretor do Centro de Estudos de História Religiosa da UCP destaca desenvolvimento de «consciência crítica» na relação com o Estado Novo
Lisboa, 25 abr 2023 (Ecclesia) – O diretor do Centro de Estudos de História Religiosa (CEHR) da Universidade Católica Portuguesa (UCP) disse à Agência ECCLESIA que, após o 25 de Abril de 1974, se verifica um reposicionamento da Igreja “na nova sociedade livre, como projeto”.
“Os católicos vão estar, desde a primeira hora, a participar de maneira diversificada e plural, em vários setores, não só sociais, mas também claramente políticos”, sublinha o historiador Paulo Fontes.
Para o investigador, o 25 de Abril levou, entre outras mudanças, ao “reconhecimento da pluralidade, no interior da Igreja Católica”.
O CEHR desenvolve até 2026 um projeto de investigação sobre o 25 de Abril, procurando novas abordagens sobre o tema.
O docente universitário recorda que “uma boa parte dos católicos” que viveu esse período se empenhou na implantação de um novo regime político e no fim da Guerra Colonial, sentindo a “possibilidade de realização da sociedade nova”.
“Isso inscreve-se numa matriz dos católicos sociais, digamos assim, que, desde o séc. XIX procuravam estar presentes na sociedade, para a tornar mais humana, mais participada, mais conforme aos grandes valores evangélicos, no fundo”, aponta Paulo Fontes.
O historiador, autor da obra ‘Elites católicas em Portugal: o papel da Acção Católica (1940-1961)’, destaca que estes movimentos tiveram um “papel muito significativo” nas mudanças da sociedade portuguesa, “no sentido de uma certa modernização”.
Esses setores católicos mais dinâmicos, mais apostados na renovação, na modernização, numa sociedade nova, vão encontrar-se em dissonância e afastamento relativamente ao projeto político do Estado Novo”.
O diretor do CEHR aponta, em particular, duas razões para esta mobilização: a falta de liberdade e opressão política, por um lado, e o peso “avassalador” da Guerra Colonial, que mobilizou 200 mil combatentes e consumiu muitos recursos do Estado.
Estes fatores, precisa Paulo Fontes, abriram a “possibilidade de distanciamento crítico, de uma resistência moral e, nalguns setores, de uma posição política”.
O investigador alude ao surgimento de dinâmicas de liderança, no mundo operário, de organização sindical, e no mundo académico, uma mudança mais acentuada a partir de 1965, ano em que é publicado o “manifesto dos 101 católicos”, com uma posição “mais declarada” contra o regime e a Guerra Colonial.
“Os setores católicos tinham espaços, possibilidades de comunicação, menos vigiados, embora também sujeitos progressivamente a uma maior censura e até repressão”, recorda o entrevistado.
Paulo Fontes recorda ainda o protagonismo de “novas lideranças” católicas, que surgem com “grande pluralidade”, depois do Concílio Vaticano II (1962-1965) e dos pontificados de João XXIII e Paulo VI.
O especialista observa que, no período anterior à revolução, os católicos tiveram posições divergentes, havendo também responsáveis ligados ao Estado Novo ou quem se tenha envolvido na “ala liberal” do regime.
O “oposicionismo católico” que se veio a desenvolver teve também como referência D. António Ferreira Gomes”, bispo do Porto, obrigado ao exílio a partir de 1959.
Temas como a luta anticolonial, a valorização das mulheres, a saúde, a liberalização do regime, a renovação cultural ou a modernização económica vieram a gerar uma “consciência crítica, comum, ainda que com sensibilidades políticas muito diversificadas”.
‘25 de Abril: permanências, ruturas e recomposições’ é o nome do projeto do CEHR, que procura suscitar novas reflexões entre investigadores, no âmbito da História Religiosa Contemporânea.
PR/OC