A dimensão social e mesmo política da Igreja Católica esteve em destaque num ano de 2010 marcado pela repetição da palavra “crise”, camuflada com siglas – PEC, OE, FMI, TGV, NATO, BPN, IRS, PIB ou BCE.
A criação de um “Fundo Social Solidário”, pela Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) e iniciativas semelhantes em várias dioceses (nalguns casos, já sem recursos para conseguir responder às solicitações) concretizaram preocupações várias vezes manifestadas.
“As medidas de austeridade, para merecerem acolhimento benévolo dos cidadãos, têm de ser acompanhadas de forte intervenção na correcção de desequilíbrios inaceitáveis e de provocantes atentados à justiça social”, referia o comunicado final da assembleia plenária da CEP, em Novembro.
Sucessivas mensagens e intervenções dos bispos, particularmente depois da visita de Bento XVI, em Maio, convergiram, no final do ano, numa mensagem conjunta de Natal em que se aponta o dedo, entre outros, à “a falta de coragem e verdade governativas”.
2010 foi o Ano Europeu do Combate à Pobreza e à Exclusão Social, tentando colocar no centro das preocupações os que “não têm voz na sociedade”, como frisava o presidente da Comissão Episcopal da Pastoral Social, D. Carlos Azevedo.
Para D. Jorge Ortiga, presidente da CEP, este ano ficou manchado pela ausência de “iniciativas concretas para a verdadeira erradicação da pobreza, com o compromisso dos Estados”.
O aumento do desemprego, as anunciadas medidas de austeridade e o agravamento das condições sociais e económicas levou a um aumento de «novos pobres», acompanhados pelas instituições eclesiais em todo o país.
O olhar da Cáritas Portuguesa esteve ainda sintonizado nas tragédias, tanto em Portugal como no estrangeiro, em particular o Haiti.
O dia 20 de Fevereiro fica na história da Madeira, por força das chuvas torrenciais que destruíram habitações e provocou dezenas de mortos. Mais uma vez, a solidariedade do povo português – através da Cáritas e outras instituições – foi visível, através de bens de toda a ordem.
Além das questões sociais, o ano fica marcado pelas problemáticas da educação. Logo em Janeiro, D. José Policarpo alertava para “nova forma de hegemonia totalitária que se disfarça com as vestes da democracia”, pedindo um sistema educativo menos dependente do Estado.
No segundo semestre do ano, a tensão entre as escolas privadas (Ensino Particular e Cooperativo) e o Ministério da Educação cresceu significativamente, por causa das novas regras de financiamento para os estabelecimentos com contratos de associação.
A CEP, em comunicado, veio a público falar numa situação que, “desde há muito, vem dificultando, em todo o País, a vida e acção destas escolas, levando, de modo progressivo, injusto e programado, ao seu desaparecimento”.
As divergências com o executivo não se ficaram por aqui: no dia 8 de Janeiro, o Parlamento aprovava a proposta do Governo que permite o casamento entre pessoas do mesmo sexo, uma “precipitação” segundo o padre Manuel Morujão, porta-voz da CEP, que viu na ausência de referendo sobre esta matéria uma “ferida democrática”.
«O Estado não é dono da família» e «Queremos votar» foram alguns slogans ouvidos numa manifestação em defesa do casamento, em Lisboa, a 20 de Fevereiro. Em Novembro, os cristãos manifestaram-se também, de outra forma: as dioceses portuguesas acederam ao convite de Bento XVI e fizeram uma vigília de oração pela «Vida Nascente».
O ano não se concluiria sem que outra iniciativa do Papa marcasse a vida da Igreja: Bento XVI aprovou a publicação do decreto que comprova um milagre atribuído à Irmã Maria Clara do Menino Jesus (1843-1899). Assim, em 2011, Portugal terá uma nova beata.
LFS/OC