Quaresma: Quando os verbos ‘criar’ e ‘percorrer’ foram substituídos por ‘aguentar’ e ‘mostrar’ – Padre Nuno Branco (c/vídeos)

Jesuita autor dos desenhos da Via-Sacra da Jornada Mundial da Juventude Lisboa 2023 atualiza a 10ª e a 11ª estação neste tempo de preparação para a Páscoa 

Lisboa, 22 mar 2024 (Ecclesia) – O padre Nuno Branco lamenta que verbos como ‘criar’, ‘gerar’, ‘percorrer’ estejam a ser substituídos por ‘aguentar’, ‘abreviar’, desviando o caminho de «iniciar processos», que é por si “revelador” de respostas.

“Desabituamo-nos a verbos como criar, gerar, e como não sabemos, dizemos mais aguentar, em vez de percorrer, atravessar, viver, habitar. Também há aqui um lado de como é que se vive bem a travessia, o caminho – não é da ordem do aguentar, nem do abreviar, nem do perpetuar. Há aqui algo de valioso nos processos. E o processo, não sei se no processo eu já estou a ver o seu efeito, o seu resultado, mas há um caminho norteado e orientado que o próprio processo também vai deslindando e vai revelando o seu desfecho”, explica o jesuíta à Agência ECCLESIA.

O autor dos desenhos da Via-Sacra da JMJ Lisboa 2023, que servem de inspiração para atualizar o caminho dos cristãos que se preparam para celebrar a Páscoa, enfatiza o quanto os processos podem ser “reveladores” se cada pessoa aceitar iniciar ou percorrer esse caminho.

Enquanto as pessoas não iniciam um caminho não sabendo ainda com exatidão ao que ele conduz, (desconhecem) que há Deus no processo – não é um instrumento do qual eu me sirvo de maneira utilitária com um fim – o processo também é revelador”, sublinha.

Imagem: padre Nuno Branco XI Estação

Convidado a revistar os desenhos da sua autoria, o jesuíta indica que a 11ª estação quando «Jesus é pregado na Cruz», convida a perceber a diferença entre “o bem-estar emocional”, que “corre o risco de se transformar no nosso Deus contemporâneo” com o “bem que Deus quer”.

“O fim do processo é sempre o seguimento de Cristo e não o estar bem, embora Ele queira o meu bem. A pergunta radical é «Quem é que é o meu Deus? É o Cristo entregue na cruz ou é o bem-estar emocional? Será a partir de um ou de outro que leio a minha vida”, explica.

O jesuíta indica ainda que a 11ª estação convida a encontrar o “lugar de dignidade” e reconhece-a na “verdade”.

“Jesus, ladeado por ladrões a quem garante que estarão juntos, que já não podem fazer nada porque estão na cruz, é-lhes reconhecida dignidade. Portanto até alguém que já não pode fazer nada lhe foi reconhecida uma dignidade, porque essa dignidade vem de dentro. Nem o próprio pecado conseguiu roubar a dignidade de alguém que já não pode fazer nada”, reconhece.

A partir da 10ª estação da Via-Sacra, que a tradição reconhece como os últimos momentos da vida de Jesus, o padre Nuno Branco refere-se ao controlo da imagem pública que se persegue.

“Eu acho que hoje em dia temos uma apetência muito voltada para a imagem social. E, nas vestes, existe uma dimensão de aparência. Hoje, mais do que nunca, nós vivemos para a imagem. E é bom – a boa imagem, a boa aparência, é uma forma de respeito também. Mas confundimos o dar bom exemplo com dar bom testemunho. E às vezes, queremos dar bons exemplos mas não estamos a dar testemunho de nada, a não ser de nós próprios”, explica.

Imagem: padre Nuno Branco X Estação

Quando no caminho da Via-Sacra, na 10ª estação onde «Jesus é despojado das suas vestes», mostra a procura da verdade, encontrando uma “verdade que une”

“Jesus, ao lhes serem retiradas as suas vestes, intensifica a verdade de Jesus, pois não controla o modo como vai ser visto. E hoje em dia, aquilo que também nós desejamos é ter algum controle no modo como queremos ser vistos”, reconhece.

A aparência e o controlo, explica o jesuíta, mostram o medo de “ser recusado, de ser negado ou não valorizado”.

O padre Nuno Branco lamenta ainda a cultura da indiferença “que deixa de fora da fotografia e vota muitos à invisibilidade”.

O percurso da Via-Sacra, com o padre Nuno Branco, é apresentado online, nos canais da Agência ECCLESIA, e no programa da Igreja Católica na Antena 1 da rádio pública, a cada sábado de Quaresma, pelas 06h00.

LS

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