Porto: «Aumentou o número da população idosa que está, de facto, desprotegida» – Fernando Paulo

Após a celebração do Dia Mundial da Consciencialização da Violência contra as Pessoas Idosas (15 de junho), é convidado da Renascença e da Agência Ecclesia o vereador com o pelouro da Coesão Social da Câmara Municipal do Porto

Foto: RR

Entrevista conduzida por Henrique Cunha (Renascença) e Octávio Carmo (Ecclesia)

A autarquia que está a desenvolver um plano para responder aos desafios do rápido envelhecimento. Quais são os grandes desafios deste plano? O principal problema está relacionado com a segurança e com o isolamento?

Sem dúvida. Antes de mais, o Porto tem vindo a assistir a uma taxa de envelhecimento crescente. Temos uma taxa que ronda os 220%, o que nos coloca, de facto, na cidade mais envelhecida do país. Portugal é o quinto país mais envelhecido do mundo e, portanto, há aqui desafios que se colocam. Proporcionar um envelhecimento ativo é um desafio, mas, sobretudo, temos de olhar para aquilo que é a realidade que hoje vive a nossa população idosa, sénior, e, por isso, este plano constitui uma resposta a este rápido envelhecimento da população, porque o isolamento e a solidão são um dos problemas maiores que atingem esta população sénior.

 

Precisamente, o plano prevê a criação de uma comissão para sinalizar idosos em isolamento e exclusão. Esse trabalho está feito, há uma ideia mais exata de qual é a realidade no Porto?

Nós temos cerca de 33 mil pessoas com mais de 65 anos que vivem sozinhas e destas, há um número significativo que está em risco. Cerca de 20% dos nossos idosos têm problemas graves a este nível e, portanto, a Comissão Municipal de Apoio ao Idoso procura envolver não só o município, mas as Juntas de Freguesia, a Segurança Social, os serviços de saúde e outras organizações não-governamentais, no sentido de podermos criar um radar que permita quebrar a invisibilidade e sabermos onde é que estão os idosos a viver em situação de isolamento e que têm problemas, os quais carecem de uma resposta específica. Este o grande objetivo é criar um radar para quebrar o isolamento. Inspiramo-nos muito na altura da Covid, porque percebemos que, em muitas das situações que nos apareciam, muitos dos nossos idosos não tinham qualquer laço de vizinhança, qualquer laço com as suas famílias e, de facto, viviam sós, viviam abandonados, com problemas e necessidade de respostas concretas.

 

Não seria necessária uma estratégia alargada, uma estratégia, digamos, metropolitana para se perceber a dimensão do problema e para se preparar a uma ação concertada e mais eficaz?

Sim. Enquanto humanidade, hoje temos vários desafios, a pobreza e a exclusão social estão muito presentes na nossa sociedade. Portugal tem cerca de 18% de pessoas a viver em situação de pobreza e exclusão social; invariavelmente, os grupos mais atingidos são os vulneráveis, entre os quais temos a nossa população idosa.

E é necessário adequarmos as respostas às necessidades. Nós temos de personalizar hoje também as respostas, em função da especificidade das necessidades da população. Temos um conjunto de população sénior que está relativamente incluída, inserida na comunidade, mas que precisa de serviços adaptados às suas necessidades.

Temos outras pessoas que, fruto deste envelhecimento que padecem hoje de determinadas respostas, algumas tradicionais, como a Estrutura Residencial para Pessoas Idosas ou apoio domiciliário, Centro de Dia ou Centro de Convívio, que não chegam… as respostas hoje são manifestamente insuficientes para essas necessidades. Também temos de introduzir aqui a questão da inovação social, encontrar novas respostas para novas necessidades e novas exigências. E temos, sobretudo, de prevenir e também investir muito no chamado envelhecimento ativo. Aquilo que nós percebemos é que, muitas vezes, a população idosa é como se perdesse cidadania e nós queremos que a cidade, as pessoas possam ter uma vida ativa e plena em todas as fases da vida, que o envelhecimento seja prazeroso e que as pessoas não percam a cidadania e possam, naturalmente, ser cidadãos de plenos direitos e plenos deveres, perfeitamente inseridos na comunidade. Isto é muito desafiante.

 

Olhando para a cidade e sabendo dos problemas de habitação, que são amplamente noticiados, pergunto se, entre estes idosos isolados ou abandonados, têm sido detetadas situações de pessoas sem-abrigo?

Sim, nós apresentámos há poucos dias o número das pessoas em situação de sem-abrigo na cidade. Felizmente, diminuímos em 11% o número de pessoas que, de acordo com a definição da estratégia, vivem em condição de sem-abrigo, mas aumentou o número de pessoas sem teto, que vivem na rua. E também aumentou o número da população idosa que está, de facto, desprotegida e que está a viver na rua.

A questão da habitação é um problema estrutural. É um dos pilares sociais que mais tem sido difícil de concretizar no nosso país. Aliás, a Lei de Bases da Habitação tem 3 ou 4 anos, portanto, vai atingindo, de facto, muito a nossa população e a população idosa; para além do problema do acesso à habitação, nós hoje também temos muita população idosa que está a viver em condições de grande indignidade, ou seja, não estando desprotegida, mas as condições de habitação são, de facto, muito indignas e também temos procurado atuar a esse nível.

 

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E que papel têm as instituições sociais e da Igreja Católica, em todo este processo?

Naturalmente que têm aqui um papel fundamental. Nós não podemos deixar de considerar que no nosso país, eu costumo dizer que o Serviço Nacional de Respostas Sociais é assumido pelas Instituições Particulares de Socialidade Social, em que a Igreja Católica tem um papel extraordinariamente importante, através das suas respostas sociais. Aliás, na cidade do Porto, a obra de Diocesana de Promoção Social, foi constituída pela Igreja Católica conjuntamente com a Câmara e a Segurança Social, é a maior instituição particular de socialidade da cidade: dá resposta a mais de 2 mil pessoas diariamente, nas mais diversas valências em que o apoio domiciliário, as Estruturas Residenciais para Pessoas Idosas, centros de dia, centros de convívio têm aqui um papel fundamental, não só pela resposta que dão, mas pela resposta humanizada. Hoje é um desafio que se coloca, a democratização no acesso aos diversos serviços, mas também a possibilidade deste serviço oferecer, além da questão hoteleira, de saúde, da alimentação, os serviços sociais e básicos. Também é uma resposta humanizada e, de facto, a tradição e as respostas assumidas pelas IPSS, especialmente as ligadas à Igreja, têm sempre aqui um cunho que vale a pena salientar, é um serviço muito humanizado, muito próximo das pessoas, acionando o voluntariado. isto é extraordinariamente importante, não só nas pessoas que servem, como também os servidores, quer os voluntários quer os próprios funcionários: temos de humanizar as pessoas, porque humanizando as pessoas, humanizamos a cidade.

 

Começamos esta conversa pelo plano ‘Porto Cidade Amiga das Pessoas Idosas’, que vai até 2025. A autarquia tem intenção de prolongar no tempo este plano?

Sem dúvida, nós vamos fazer as terceiras jornadas ‘Porto Cidade Amiga das Pessoas Idosas’ já em setembro, para fazer a avaliação de um ano de implementação deste plano. Este é um compromisso social com a cidade, não só do município, porque este plano tem cerca de 80 ações, envolveu mais de 70 organizações, queremos criar uma cidade consciente do dever de proteger, de apoiar os nossos idosos e criar condições para que todos possam ter uma vida ativa e plena. Hoje, os desafios que se colocam estão em várias dimensões, porque proporcionar este envelhecimento ativo faz com que exista um conjunto de determinantes que são fundamentais. Por isso, envolvemos as várias unidades orgânicas do município, mas também os baixos setores de atividade: a questão dos transportes, a questão do espaço público, a questão da animação, a questão do acesso ao desporto, a humanização dos serviços de saúde, o apoio à proteção social, a questão das acessibilidades, são um conjunto de fatores que contribuem para esta cidade mais igual, para esta cidade mais coesa e nós temos de estar atentos a essas situações. Os idosos só podem sair de casa se nós derrubarmos barreiras físicas, se criarmos um transporte amigável das pessoas, se os jardins e o espaço público se sentirem que são seguros. Pode ter a questão dos animais, das trotinetes, dos bebedouros, dos bancos, dos sanitários, há aqui um conjunto de determinantes. Temos de estar atentos a isso e o plano procura, de facto, responder e responsabilizar toda a cidade nesta proteção.

 

Que importância tem o facto de o Porto integrar a rede mundial de cidades amigas das pessoas idosas e, já agora, que mais cidades portuguesas possam integrar esta rede?

Sim, já mais de mil cidades de 55 países integram esta rede, que foi criada pela Organização Mundial de Saúde. Aquilo que aprendemos, socorrendo-me das palavras do antigo secretário-geral da ONU, Kofi Annan, é que a expansão do envelhecer não é um problema, é sim uma das maiores conquistas da humanidade. O que é necessário é traçarmos políticas ajustadas para um envelhecimento são, autónomo, ativo e plenamente integrado. Temos vindo a trabalhar com a Organização Mundial de Saúde porque acreditamos muito neste projeto e o Porto não quer estar isolado, nem quer dizer que é a única cidade que tem um plano. Queremos criar um movimento, para que esta rede se expanda no plano nacional, já iniciamos contactos, houve uma reunião em Faro e estamos em contacto também com o escritório da Europa da Organização Mundial de Saúde, no sentido de podermos também ser um estímulo e um apoio para criar – numa cooperação interministerial ao nível do governo e depois nos municípios -uma estratégia de expansão da rede. Numa primeira fase, a OMS não contava com os municípios para a expansão desta rede e parece-nos que ela pode expandir-se mais rapidamente responsabilizando os municípios, pela capacidade que têm em poder envolver mais organizações no princípio da subsidiariedade, que aliás é um princípio da Doutrina Social da Igreja.

 

Olhando agora para a questão da violência sobre pessoas idosas, uma das realidades mais cruéis, digamos assim, é a do abandono hospitalar, apesar do esforço do Estado e de instituições, aquilo a que se chamam os internamentos sociais, o seu número não para de aumentar. Pergunto-lhe como é que está a realidade no Porto e que contributo é que a autarquia pode dar para superar este fenómeno?

 

A nossa rede social, neste momento, conta com 326 organizações e temos as comissões sociais de freguesia organizadas e procuramos que todo este trabalho da área social seja um trabalho partilhado, de corresponsabilidade, de um diagnóstico conjunto e também de uma partilha de responsabilidades, de complementaridade nas respostas que é necessário dar. Nós temos vindo a trabalhar com os hospitais, também com a Segurança Social, no sentido de identificar o problema e de poder conseguir adequar as respostas para aquilo que são as necessidades. E de facto, neste momento, no Distrito do Porto, a Segurança Social terá mais de 600 pedidos de urgência, de situações de vulnerabilidade, a aguardar vaga em estrutura residencial para pessoas idosas.

Ou seja, é necessário nós investirmos fortemente – o Estado Central, que não descentralizou para as autarquias as respostas sociais – apesar de as autarquias terem aqui uma grande responsabilidade.

 

Doutor Fernando Paulo, só para clarificar: haverá nesta altura cerca de 600 pessoas em internamento social?

 

Não, não.  Estou a falar de situações que estão a aguardar por resposta e que pertencem a grupos vulneráveis. E aqui no Distrito do Porto, estão identificados pelos serviços de atendimento social, e sinalizados pelos hospitais, nós teremos, à volta de 600 pessoas, a aguardar resposta em estrutura residencial para pessoas idosas.

Nos nossos hospitais, na situação de Covid, nós chegamos a ter, nos hospitais do Porto, à volta de 150 pessoas que tinham alta clínica e não tinham para onde ir e, portanto, aguardavam essa disponibilidade. Praticamente, com o fim do Covid, essa situação foi resolvida, mas neste momento temos, outra vez situações que se estão a acumular.

 

Mas não tem ideia do número? 

Neste momento não temos um número concreto, mas andará muito próximo das 100 pessoas outra vez. E, portanto, há aqui a necessidade de olhar para esta realidade. Conseguirmos investir, eu não diria apenas em estruturas residenciais para pessoas idosas, porque há aqui uma evolução hoje também na prestação dos cuidados de saúde.

Parte do princípio de que no domicílio as pessoas têm as condições para lhes ser assegurada a continuidade de um conjunto de apoios e de acompanhamento, mas isso de facto não acontece. Nós precisamos de investir mais em cuidados continuados de média e longa duração, precisamos de estruturas também intermédias entre a alta clínica e aquilo que são a resposta para o regresso ao lar. Mas a estrutura familiar hoje também se alterou profundamente e, portanto, temos de criar respostas diferenciadas, porque aquilo que é hoje a realidade da alta clínica de um hospital não corresponde àquilo que é a possibilidade, no seio familiar, de a pessoa poder convalescer e recuperar totalmente no domicílio.

 

Até que ponto a descentralização de competências na área que tutela pode tornar mais eficaz a intervenção? Houve uma grande resistência por parte dos municípios, em particular por parte do município do Porto ao processo de descentralização e transferência de competências nesta área. Está pacificada essa situação?

Completamente pacificada.  Ainda bem que coloquei essa questão, e a história há-de repor aquilo que foi a verdade dos factos.  Aliás, a Ministra Ana Abrunhosa e Ana Mendes Godinho sabem que foi o Porto que lhes levou a esta situação e que fez com que o Governo alterasse aquilo que era os cerca de 50 milhões iniciais para a descentralização na área social e passasse para 90 milhões de euros.

Nós levámos uma questão concreta e assumimos um compromisso que foi, nós não concordávamos que nos passassem processos cujo volume processual para acompanhar famílias vulneráveis, ao nível do RSI (Rendimento Social de Inserção) e do SAS (Serviço de Ação Social), fosse à volta de 500 processos por técnico. Isso era impossível. E nós demonstramos que era isto o que estava previsto.

E, portanto, o Governo reviu e bem a situação, alterou-se este rácio para 100 processos por técnico e o Porto, há cerca de um mês fez uma avaliação e o balanço que foi extremamente positivo. Defendemos o princípio da descentralização, sempre estivemos de acordo com ele; apenas exigíamos que houvesse o número mínimo de técnicos capaz de ajudar a criar oportunidade. E hoje os números estão à vista. Aliás o número de pessoas em situação de sem abrigo diminuiu e nós somos acérrimos defensores do princípio da subsidiariedade, porque estando mais próximos nós conseguimos implicar melhor os técnicos, capacitar, qualificar, coordenar todo este trabalho, gerar complementaridades e fazer as articulações que é necessário. Entre as questões de gênero, entre as questões da violência doméstica, questões idosas, questões da proteção de crianças e jovens em risco, as famílias com grupos mais vulneráveis e, portanto, todas estas situações.

Criámos recentemente o núcleo de garantia para a infância, estamos com o plano de ação Porto cidade Amiga das Pessoas Idosas, o Plano Municipal de Saúde, vamos assinar agora o protocolo no âmbito da referenciação da rede de violência doméstica, estamos a atualizar o nosso diagnóstico do plano de desenvolvimento social, e elaborar também o plano municipal de combate à pobreza e portanto achamos que do ponto de vista local, nesta articulação com todas as entidades, nós conseguimos gerar uma maior oportunidade para a inclusão, para a inserção e sobretudo para que todos os cidadãos possam aceder àquilo que a cidade tem para oferecer e sobretudo oportunidade para que todas as pessoas estejam felizes.

 

Nós começamos esta conversa por recordar o Dia Mundial da Consciencialização da Violência contra as Pessoas Idosas que se assinalou no sábado. Isto é um fenómeno particularmente chocante, e certamente deve merecer a atenção de todos. Eu pergunto-lhe como olha para os casos que se vão verificar na sociedade portuguesa e se teme que um agravamento da crise económica possa criar situações de violência? 

Sem dúvida. A questão de violência é uma questão que nos deve ocupar, sobre qualquer pessoa, e naturalmente sobre os grupos mais vulneráveis, aqueles que não têm voz e que vivem em situação de maior isolamento e de invisibilidade e esta é a nossa preocupação primeira e por isso este plano de ação tem algumas medidas concretas no sentido de combater a invisibilidade. Mas acreditamos muito também que temos de ser motores de mudança, fazer a pedagogia do envelhecimento, também da cidadania, da questão dos valores, da ética, o investimento na educação, na preparação e na qualificação dos nossos técnicos e sobretudo mostrar que todos os cidadãos, do ponto de vista ético, a nossa corresponsabilidade enquanto cidadãos, enquanto profissionais, que devemos criar as condições para de facto olhar a outra pessoa na sua dignidade, nos seus direitos humanos e devemos preparar os serviços para combater todas as formas de violência. É isso que nós temos feito, por exemplo, ao nível das comunidades migrantes, muitas vezes há estereótipos e preconceitos que há relativamente a determinados grupos.

 

Mas houve um aumento de insegurança com a imigração no Porto ou não? 

Não, nós não ligamos um facto ao outro. Às vezes a comunicação social liga estas questões.

 

Foto: RR

A comunicação social dá eco do que diz a sociedade e os atores políticos, não é? 

Sim, aqui, entendam, não era uma crítica à comunicação social. Às vezes dá voz a essas questões, mas nós não fazemos uma ligação direta. Eu tenho a área da coesão social, nós temos uma comunidade migrante hoje legalizada com mais de 23 mil imigrantes na cidade, as nossas escolas públicas do pré-escolar ao 12º ano têm 3200 alunos, nós não temos questões de insegurança, bem pelo contrário. É uma oportunidade de educar para a diversidade, para a tolerância, para os valores. Nós temos os nossos mediadores municipais interculturais para trabalhar com as comunidades migrantes, temos escolas que têm mais de 40 comunidades e, de facto, não temos situações de violência. Agora, é natural que haja determinados grupos, que as forças de segurança vão acompanhando, mas não tem nada a ver com este fenómeno da imigração. Há outro tipo de fenómenos que estão a acontecer, mas não tem a ver com esta diversidade cultural, que tem sido uma oportunidade para o município trabalhar e para que a cidade no seu todo também crie as condições para ser mais tolerante, mais compreensiva. Ainda há poucos dias recebi uma comitiva do Porto com as várias igrejas que estão no Porto. Nós encomendámos à Universidade Lusófona um trabalho, e neste momento a Universidade está a preparar em conjunto com a autarquia uma Carta das Religiões, para fazermos todo o levantamento do culto no município. Porque tudo isto é uma oportunidade para sensibilizarmos e despertarmos para a multiculturalidade.

 

Quando é que estará pronta essa carta? 

Esperemos que dentro de 6, 7 meses esteja pronta e, portanto, mais do que georreferenciar, para nós é uma oportunidade de nos aproximarmos e para mostrar que devemos celebrar esta diversidade cultural, porque ela é uma oportunidade também para educarmos para os valores, para esta diversidade. O Porto é uma cidade cosmopolita, uma cidade aberta e tolerante, democrática, livre, mas às vezes é um pouco conservadora e, portanto, nós também temos de desconstruir preconceitos.

E o mesmo acontece relativamente aos idosos. Hoje, do ponto de vista social, é como que se os idosos, a partir de uma determinada idade, perdessem a sua capacidade de decidir, são os filhos que decidem por ele, são institucionalizados. Muitas vezes perdem o título, perdem a sua história, passam a ser o nome. E nós queremos contrariar esta situação. Nós temos que potenciar e aproveitar aquilo que são experiências de vida e dar oportunidade para que haja esta cidadania ativa e plena. Isto é uma forma também de combatermos as várias formas de violência, de quebrar a invisibilidade, de criar serviços e, sobretudo, criar uma cidade plena. Nós queremos que a cidade seja vivida. Temos 42 quilómetros quadrados, temos uma diversidade de equipamentos culturais, atividades desportivas, um conjunto de serviços e queremos, de facto, que a cidade seja vivida por todos.

 

Na sua mensagem para o IV Dia Mundial dos Avós e Idosos, o Papa Francisco pediu coragem no combate ao abandono e alertou para as atitudes egoístas que levam ao descarte. Falta na sociedade esta aposta na educação, para a cidadania e para a solidariedade? 

Sim. Nas nossas escolas do primeiro ciclo temos, por exemplo, filosofia, temos yoga, temos judo no pré-escolar, são atividades que às vezes nos convidam a uma outra atitude, a uma outra reflexão, mas acho que é preciso continuar a educar. Eu sou da área da filosofia e vejo que, por exemplo, a filosofia quase que desaparece dos currículos do ensino secundário. Eu acho que nós precisamos de investir e capacitar ainda muito mais para este exercício de cidadania, para respeitarmos o outro na sua dignidade, na sua identidade e na sua necessidade de ser feliz. Nós precisamos olhar o ser humano neste sentido ético de responsabilidade e, portanto, achamos que há muito bons exemplos, estamos no bom caminho, mas este tem de ser um esforço continuado. Temos de continuar a investir para, que de facto, as nossas cidades sejam cidades participadas. Nós somos seres de relação e é na relação com os outros que nós somos verdadeiramente pessoas e é nesta relação que nós temos que cultivar e aprofundar, que de facto também reconhecemos o outro no sentido ético, na sua dignidade. É nisso que nós acreditamos, é por isso que continuamos a trabalhar.

 

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