Os meus mortos vivem comigo

José Luís Nunes Martins  

Quando a morte leva para longe alguém que amamos, tudo o mais perde importância. A vida fica estranha, por um lado parece que afinal não tem valor algum, mas, por outro, torna-se mais preciosa do que nunca.

Faz-nos falta quem perdemos e faz-nos falta aprender a lidar com a nossa vida sem eles.

A existência como que perde sentido, porque ficamos sem compreender nem a morte nem a vida.

E a minha? Quando será? Sofrerei? E os meus, sentirão a minha falta?

Talvez seja bom eu aprender a preocupar-me mais com a minha vida do que com a minha morte. Se vivo à espera de morrer, morrerei à espera de viver.

A vida não é permanecer nem desaparecer. É ir evoluindo ao longo do tempo, até mesmo depois das negras trevas da morte nos tomarem. Ficamos com os que ficam, levando connosco, para onde formos, o amor com que se deram a nós. Honra com a tua vida a vida dos que te amaram.

Os que me morrem, matam-me na medida em que a sua vida também era minha. Assim como a minha era sua. Viver é duro, viver sozinho torna a existência quase insuportável. O amor é essencial à vida. Sem amor, tudo, no fundo, é morte.

Quando chega o último momento, não é do amor que nos arrependemos!

Cada dia que passa tira-nos tempo que foi nosso, mas que já não o é. Tal como na morte, a vida é acabar e começar a cada instante.

O que viam os meus olhos antes dos meus pais sequer se conhecerem? Talvez eu já fosse quem sou, muito antes de nascer, apesar de não o saber. Nem na altura, nem agora!

Tenho de ser capaz de me entregar ao depois com a mesma fé com que tenho a certeza de que o amor nunca morre.

Afinal, de onde me chega a confiança de que acordarei sempre que, a cada noite, me entrego ao sono?

 

 

 

 

 

Dedico este texto ao meu amigo Pe. João Aguiar Campos que terá chegado ao Céu no passado dia 27 de abril de 2023. Obrigado, muito, muito!

 

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