Marcelo Gleiser: a Fonte da Curiosidade

Miguel Oliveira Panão (Professor Universitário), Blog & Autor

O físico Marcelo Gleiser é o primeiro latino-americano a vencer o Prémio Templeton de 1,4 milhões de dólares conferido a pessoas que deram um contributo excepcional na afirmação da dimensão espiritual da vida.

A mensagem de consiliência

Gleiser afirma que ”a ciência é um modo de conectar-se com o mistério da existência.” Esse mistério é o que nos deslumbra quando contemplamos o mundo à nossa volta e questionamos sobre quem somos e de onde vimos. São as questões que incluem o modo científico como exploramos e compreendemos a realidade do universo, mas vão além dessa e procuram uma grande visão que provém da profunda necessidade espiritual que temos de estarmos ligados ao universo através do nosso corpo e da mente.

A necessidade de humildade em ciência

Uma vez que a mente humana, apesar de ser um feito evolutivo extraordinário, é aquela pequena ”massa cinzenta” que procura compreender o que está muito para além de si mesma, não admira que, para Gleiser, a crença na humildade é um dos propósitos espirituais mais relevantes para um cientista. Na abordagem que faz ao conhecimento, que possui limites que devem ser respeitados, o cientista procura, também, compreender como se dá o avanço científico, e será no contacto que faz com o mistério envolvido naquilo que não sabemos que se cria o espaço para uma conversa espiritual profunda através do universo.

A fonte fundamental da curiosidade

Gleiser afirmou uma vez que ”os cientistas, de certa forma, são pessoas que mantêm a curiosidade a arder, tentando encontrar respostas a algumas questões que perguntavam quando eram crianças.” Por muito que a origem do universo e o modo como evoluiu sejam fascinantes, e por mais misteriosa que seja a passagem da ausência de vida para a sua emergência, nenhuma destas questões é a fonte fundamental da curiosidade de Marcelo. Na raíz está uma experiência mais profunda. A perda da sua mãe.

”Eu tinha seis anos e essa perda foi absolutamente devastadora. Colocou-me em contacto com a noção do tempo desde muito novo. E, obviamente, a religião foi o que me chegou de imediato por ser judeu, mas eu fiquei muito desiludido com o Antigo Testamento na adolescência, e foi aí que encontrei Einstein. Foi aí que me dei conta de que podemos questionar sobre a natureza do tempo e do espaço, e questionar sobre a própria natureza, através da ciência. (…) E, por isso, eu penso ter sido este prematuro sentido da perda que me tornou curioso acerca da existência.”

A lição universal que podemos tirar é a de que são as experiências que traçam o caminho que percorremos na nossa história pessoal. Não são os intelectualismos, ou as inúmeras fontes de entertenimento que nos mantêm distraídos, mas as experiências. Este cientista afirma-se como agnóstico e reconhece a incapacidade que a ciência tem de se pronunciar sobre Deus.

Quantos não perdem a fé em Deus por não terem qualquer experiência do Seu amor que tenha despertado a curiosidade e a vontade de conhecer mais. Com o tsunami cultural de hoje que consome grande parte da economia da nossa atenção, valeria a pena algum jejum digital nesta quaresma que desse mais espaço às experiências de Deus que se fazem através de um universo que não deixa de nos deslumbrar. Da próxima vez que olhares para as estrelas, pensa nisso.

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