Lisboa 2023: Mahoor Kaffashian, estudante iraniana, conta a sua história ao Papa (c/vídeo)

«A palavra refugiada é muito curta para aquilo que tu és», afirma bolseira da Universidade Católica Portuguesa

Viseu, 03 ago 2023 (Ecclesia) – Mahoor Kaffashian nasceu no Irão há 25 anos e durante quatro anos estudou na Ucrânia, até que no dia 22 de fevereiro de 2022 teve de fugir, iniciando uma viagem por vários países que terminou em Portugal.

“Refugiado não descreve o que sou propriamente. Ser refugiada diz-me que não posso sair para ir visitar os meus pais porque perco a proteção; ser refugiado hoje é a minha situação e significa que quando eu defender a minha tese o meu pai não vai estar sentado ao meu lado a assistir; ser refugiado significa todos os momentos em que fui sempre questionada por não ser ucraniana, mas uma iraniana com um governo com o qual tenho de lidar. A palavra «refugiado» é muito curto para aquilo que tu és”, conta à Agência ECCLESIA a estudante de Medicina Dentária da Universidade Católica Portuguesa.

A jovem iraniana, bolseira Fundo de Acção Social ‘Papa Francisco’, da Universidade Católica Portuguesa, vai estar com o Papa, em Lisboa, onde vai partilhar a sua história, acreditando, com esperança, “que melhores dias virão”.

Fugimos com uma mala, apenas com comida seca, um relógio que a minha avó me deu e um gato. Um amigo foi apanhar-nos num carro e nas primeiras horas a nossa ideia não era deixar o país, porque na verdade, achávamos que o exército da Ucrânia não conseguiria resistir muito tempo. Mas depois de 10 horas, ouvimos as sirenes e o som das bombas e pensamos que seria a hora de sair, permanecendo na fronteira. Apanhamos tudo o que pudemos e deixamos a Ucrânia”.

Foto: Agência ECCLESIA/LS

O desejo de estudar, ser mulher num contexto plural, levou esta jovem do Irão, filha única, a deixar os seus pais e o seu país natal aos 18 anos para construir um futuro, onde, explica, pudesse ser quem realmente é.

“Sempre tive problemas de inserção no Irão, talvez também pela minha família que me ajudava a ser quem eu sou e no Irão é difícil seres quem tu és. Foi a decisão familiar mais difícil que tomamos em toda a nossa vida, mas para ter o futuro que eu queria, tinha de sair”, recorda.

Chegou à Ucrânia em 2018 inicialmente para estudar aviação mas a Matemática e a Física levaram-na a optar por Medicina Dentária, onde completou o 5º ano de estudos.

Desde que deixou Kiev, capital da Ucrânia, Mahoor passou a fronteira com a Polónia, onde ficou dez dias na Polónia, rumou a Varsóvia, seguiu para a Alemanha onde esteve em Berlim e Munique, com muitas noites dormidas na rua, com um cobertor da Cruz Vermelha “muito brilhante” como aconchego, algumas noites numa igreja, onde “durante cinco dias só comeu Nutella”: “Hoje odeio Nutella”.

Foto: Agência ECCLESIA/LS

O esforço era encontrar um local onde os seus estudos fossem reconhecidos e pudesse continuar o seu projeto: “Mandei um e-mail para Tóquio – não fazia a mínima ideia de como ir ter a Tóquio, mas o desespero era grande”.

“Portugal apareceu como possibilidade, mesmo que ténue no início, mas houve sempre alguém a atender o telefone e a ajudar-nos. Decidimos vir pessoalmente para tentar perceber se realmente poderíamos ser aceites aqui. Quem nos recebeu ficou chocado quando chegámos e dissemos que queríamos ter a certeza que seriamos aceites. Mostrou-nos todos os cantos e quando vimos a Clinica Dentária ficamos muito entusiasmados a sonhar com a possibilidade de um dia estar ali”, recorda.

Quando a UCP convidou Mahoor a contar a sua história ao Papa Francisco, no encontro agendado para a manhã do dia 3 de agosto, a jovem iraniana ficou em choque.

Apesar de tudo o que eu passei, nunca me senti completamente orgulhosa de mim própria, mas devo dizer que este convite me fez sentir orgulho. Desde o dia em que aqui cheguei, as professoras foram anjos da guarda e sempre me disseram que o importante na vida é a forma como impactamos a sociedade. Este encontro possibilita isso também – perceber como a minha história pode impactar outros que vão ouvir e poderão ajudar, dar mais atenção à situação dos refugiados, não apenas a minha – mas a todos que sofrem por não estar com a sua família por causa da cultura de um país – espero que isso possa impactar quem pode fazer a diferença”.

Alcançar a paz de espírito é o principal objetivo de Mahoor Kaffashian, que quer apenas terminar os estudos e poder construir a sua vida.

“Preciso da paz de espírito. Anseio o momento em que não vou estar preocupada com nada, com a proteção que vai terminar, com o passaporte, de como vou viver. O meu desejo é alcançar a paz. Queria muito essa paz. Digo aos professores que quero ser rica, não pelo dinheiro, mas para poder ajudar os outros”, conta.

A Universidade Católica Portuguesa vai receber a visita do Papa Francisco para um encontro com jovens universitários.

LS

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