Igreja/Sociedade: Responsável da Santa Sé alerta para consequências de «revolução individualista»

D. Rino Fisichella falou aos participantes nas jornadas de formação do clero do sul de Portugal

Foto: Folha do Domingo

Albufeira, 29 jan 2019 (Ecclesia) – O presidente do Conselho Pontifício para a Nova Evangelização (Santa Sé) afirmou que a humanidade “não se sente em crise” porque “não pensa nas questões fundamentais da vida” e alertou para a “revolução individualista”, falando ao clero das dioceses do sul de Portugal.

“É preciso afrentar uma nova lógica do pensamento contemporâneo que já permeia as sociedades e as pessoas, modificando não pouco as categorias com as quais fomos convivendo durante vários séculos, e que de resto pareciam tão estabilizadas que não se previa a revolução que está em curso”, disse D. Rino Fisichella, em Albufeira.

Na reflexão, enviada hoje à Agência ECCLESIA, o arcebispo explicou que o fenómeno individualista “avança com as suas pretensões” que se vão impondo “todos os dias nas legislações”, sem a mínima perceção do limite que consigo transportam.

“A escatologia individualista alimenta-se do alargamento da esfera privada, da progressiva erosão do compromisso social, da permanente exigência de direitos, e do desamor por toda a espécie de responsabilidade política”, exemplificou a cerca de 120 participantes – bispos, padres e diáconos – das Dioceses do Algarve, Beja, Évora e Setúbal.

‘O Homem em crise: O desafio das Antropologias’ foi a reflexão desenvolvida esta segunda-feira pelo responsável do Vaticano, nas jornadas de formação e atualização que têm como tema geral ‘O homem: caminho de Cristo e da Igreja’.

Segundo o presidente do Conselho Pontifício para a Nova Evangelização (CPNE), hoje apresenta-se também “o fenómeno cultural do narcisismo”, lado a lado com o egoísmo e o individualismo.

“Uma primeira referência pode ser feita certamente à moda da selfie. Já não estamos perante um simples disparo fotográfico, que a tecnologia tomou possível com alguns contornos de indiscutível originalidade. A selfie, numa análise mais psíquica, é o desejo de se autofotografar sempre, onde e com quem quer que seja”, desenvolveu.

Outros dois exemplos da cultura narcisista são os “auscultadores estereofónicos, os decibéis tresloucados, os concertos pop de diferentes géneros” uma potência sonora que “deve desestabilizar o real para levar a sonhar”, e, por último, alerta que não se pode “subestimar” a elevação do corpo “à condição de um verdadeiro objeto de culto”.

“Nas atuais circunstâncias da história, não é possível repetir o mesmo erro que se cometeu no início do século passado. Em vários aspetos, a Igreja não compreendeu a gravidade do que sob a insinuação lenta mas incessante do niilismo”, observou.

D. Rino Fisichella explicou que o homem “não pensa na questão do sentido da vida” e a primeira grande questão sobre “Deus resolve-se facilmente” porque o homem de hoje “já não sente a necessidade de Deus como algo que lhe faz falta na sua vida”.

O arcebispo italiano adiantou que nas próximas décadas “é fácil verificar” que uma das questões que se deverá colocar em cima da mesa “é precisamente a da identidade”.

Para o responsável da Santa Sé, a cultura da internet é outra característica “importante” hoje que se deve “analisar”, uma “transformação histórica epocal” que “entusiasma de emotividade os que se contentam com o carpe diem para se iludirem de viver livres e felizes”, que desorienta o pensamento “habituado a refletir e a ler com racionalidade os acontecimentos”.

Hoje, o orador falou sobre o tema da ‘autonomia das realidades terrenas: secularismo e/ou secularização? Que evangelização para o Mundo Hodierno?’, nas jornadas de atualização do clero do sul, promovidas pelo Instituto Superior de Teologia de Évora, que terminam esta quinta-feira.

O desafio da evangelização, pelo contrário, obriga a olhar para o essencial. É neste terreno que se joga a credibilidade do nosso testemunho. Sempre foi assim. A fé transmitiu-se através de um encontro pessoal, feito de anúncio e de testemunho”.

O presidente do CPNE convidou a “olhar para o futuro com a certeza da esperança verdadeira” e “compromisso na fé”.

“É isso que consente que nem se fique fechados numa espécie de romantismo, que olha apenas para o passado, nem se caia num horizonte de utopia, porque enfeitiçadas por hipóteses que não poderão ser correspondidas”, sustentou.

CB/OC

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