2024: Aniversário do 25 de Abril e incêndios marcaram atualidade em Portugal, num ano em que mundo continuou envolvido em guerras

Pedro Silva Rei, historiador do Centro de Estudos de História Religiosa da UCP, Marco Martins, presidente da Câmara Municipal de Gondomar, e Mónica Dias, diretora do Instituto de Estudos Políticos da UCP, analisam acontecimentos marcantes dos últimos meses

Foto: Lusa/EPA

Lisboa, 29 dez 2024 (Ecclesia) – A comemoração dos 50.º aniversário do 25 de Abril e os incêndios de setembro, na região Norte e Centro, são acontecimentos que marcaram a nível nacional o ano de 2024, que na esfera internacional seguiu com guerras a atingir novas proporções, sem paz à vista.

“É muito importante focarmos precisamente na paz. Os nossos olhares, e sobretudo também na comunicação social, estão geralmente sempre focados na guerra. E isso já é o princípio de um grande erro”, afirmou a diretora do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa (UCP), Mónica Dias, à Agência ECCLESIA.

A guerra na Ucrânia, que entrou no terceiro ano, e o conflito entre Israel e Hamas, no Médio Oriente, que se estendeu ao Líbano e envolveu também o Irão, continuaram em 2024, bem como outros conflitos mundiais, a matar inocentes e a deixar um rasto de destruição.

A docente da UCP defende que é necessário “procurar, mesmo através de todas as dificuldades, pontes para construir a paz”, que tem que ser “justa” e “sustentável”, e conseguir que “haja negociações” e “mediadores sérios”.

Diretora do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa (UCP), Mónica Dias
Foto: Agência ECCLESIA/LS

“Não podemos esquecer que, por exemplo, no caso da Ucrânia, se trata de uma guerra de invasão, de quebra total das leis internacionais e também daquilo que está estabelecido, que é o respeito pelas fronteiras de um Estado soberano, que é a Ucrânia”, salientou Mónica Dias.

Segundo a diretora do Instituto de Estudos Políticos da UCP, o que se passa na Europa “trata-se de um assalto terrível e cruel sobre estas fronteiras e sobre a população da Ucrânia que sofre muito”.

“O nosso objetivo tem que ser alcançar a paz, no entanto não pode ser uma paz falsa, não pode ser um acordo ou um simples cessar-fogo que depois seja a base para daqui a mais dois anos se tentar engolir, agredir mais uma vez o povo ucraniano ou também outros povos que se situam na fronteira da Rússia”, sublinhou.

Esta “paz justa” tem, de acordo com a docente da UCP, de ser garantida com a União Europeia e a força da NATO, “que indiscutivelmente tem que estar do lado de quem foi agredido, isto é, da Ucrânia” e de conseguir precisamente a recuperação dos territórios das fronteiras do país, além da reconstrução do que foi destruído e a cura das pessoas.

Em 2024, Donald Trump venceu as eleições presidenciais norte-americanas e toma posse em janeiro de 2025, um acontecimento que Mónica Dias convida a olhar “não como algo muito complicado para [Voldymyr] Zelensky e para a população ucraniana”, mas como “uma janela de oportunidade”.

“E oportunidade para quê? Para que haja precisamente esta negociação, para que as duas partes, a Ucrânia e também a Rússia, neste caso [Vladimir] Putin e Zelensky, se possam sentar à mesa de negociações, porque uma coisa é certa, não pode haver uma paz, como Putin muitas vezes tem experimentado, sem a população, sem a vontade da população ucraniana”, salientou.

A 25 de abril de 2024 assinalaram-se os 50 anos da Revolução dos Cravos, que marcou o fim da ditadura em Portugal e a conquista da liberdade.

Este marco motivou a publicação do livro “25 de Abril. Permanências, ruturas e composições”, editado pela Agência ECCLESIA e coordenado pelo Centro de Estudos de História Religiosa da (CEHR) da UCP, que reuniu cerca de 20 historiadores e investigadores que estão no início do percurso académico.

“[A obra] procura fazer uma breve reflexão em torno da problemática do 25 de abril a partir de quatro eixos, a guerra, o desenvolvimento, a democracia e a descolonização e perceber a partir daí como é que se foi processando todas as dinâmicas de rotura, recomposições e permanências na sociedade portuguesa no caldo revolucionário”, referiu Pedro Silva Rei, historiador do CEHR da UCP.

O entrevistado indica que ainda “há muita coisa que está por fazer”, porque muitos dos artigos-síntese procuram lançar pistas de reflexão posterior, como o caso “da relação entre os católicos, os movimentos eclesiais e depois as lideranças políticas, entre outros”.

“O contexto comemorativo dos 50 anos de 25 de abril, longe de se encerrar numa lógica ritual ou memorialística sobre o passado, tem sido o contexto importante para produzir uma nova reflexão, uma nova abordagem historiográfica sobre os acontecimentos”, salientou.

Pedro Silva Rei destaca que esta é uma oportunidade para alargar o “interesse e os horizontes dos estudos historiográficos, onde o fenómeno religioso pode ser convocado como instância de observação das sociedades e do humano, neste caso, da sociedade portuguesa dos anos 70”.

A obra “25 de Abril. Permanências, ruturas e composições” encontra-se à venda e pode ser pedida através do e-mail cep.sgeral@ecclesia.pt.

Foto: Lusa

Em setembro de 2024, Portugal voltou a ser fustigado pelo drama dos incêndios que atingiram gravemente as regiões Norte e Centro do País, causando nove mortes, mais de 170 feridos, e consumindo cerca de 135 mil hectares.

Entre os concelhos afetados esteve o de Gondomar, do qual é presidente da Câmara Marco Martins, que recorda os dias do fogo como “impactantes”.

“Nós já tivemos ao longo destes anos, em que eu sou autarca, muitos incêndios. Os principais em 2016, com uma área ardida maior, mais significativa. Só que estes foram de uma violência extrema e com um conjunto de condições, quer meteorológicas, quer daquilo que são os fenómenos naturais, quer também daquilo que foi a falta de meios que criticamos, e que levou a que tivesse propagação muito rápida, que fosse impossível combate”, indica.

Apesar disso, o autarca destaca que, “felizmente, em Gondomar, os danos em habitações, em imóveis, foram limitados”, ressaltando importância do trabalho que se faz ao “longo dos anos de limpeza dos terrenos, das faixas em redor das habitações”.

“As populações foram inexcedíveis a ajudar bombeiros, quando havia bombeiros, ou então elas próprias, com os recursos que tinham, com baldes, com mangueiras, com cisternas, com tudo o que podiam”, lembra.

O presidente da Câmara Municipal de Gondomar fala em “momentos dramáticos”, referindo que enquanto autarca e como bombeiro, nunca viu “um fogo a propagar-se com tanta velocidade”.

“Tínhamos ventos muito fortes, tínhamos uma humidade do ar baixíssima e uma temperatura muito elevada que chegou a atingir os 42 graus. De facto, foram dias para não esquecer, esperemos que não se voltem a repetir”, ressaltou.

Sobre o apoio à população após os incêndios, Marco Martins dá conta que o Governo lançou logo de imediato um apoio à agricultura e pecuária, no valor de 6 mil euros a cada agricultor ou produtor e que 95 pedidos já foram aprovados, através da Câmara.

“Entretanto, decorre até ao final do mês de dezembro as candidaturas para que as empresas e os particulares possam, de uma forma geral, colocar os bens num inventário de prejuízo, para depois ver se é não aprovado o financiamento para a sua reconstrução”, explica.

Já da parte da Câmara Municipal, o autarca salienta que esta tem dado todo o apoio aos cidadãos, muitos deles até iliteratos informaticamente, a propósito do preenchimento e submissão da candidatura.

“Esperemos que o Governo, de facto, honre a palavra e dê um apoio financeiro tão rápido quanto possível”, desejou.

O Programa ’70X7′ destaca no próximo domingo cinco acontecimentos que marcaram a Igreja Católica e a sociedade, em Portugal e no mundo, em 2024, – a guerra, o Sínodo dos Bispos, os incêndios, os 50 anos do 25 de Abril e a visita ‘Ad Limina’ dos bispos portugueses -, através da análise e comentário de cinco entrevistados, pelas 17h35, na RTP2.

PR/LS/LJ/OC

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