Eutanásia: «Ciência tem sempre de mostrar que não desiste do ser humano», diz especialista em cuidados paliativos

Paulo Pina, médico na Casa de Saúde da Idanha, lamenta que existam camas vazias enquanto se debatem projetos para apressar a morte

Idanha, 19 fev 2020 (Ecclesia) – O médico Paulo Pina, paliativista e internista, lamentou em entrevista à Agência ECCLESIA que a prioridade política seja debater a despenalização da eutanásia, em vez de reforçar a oferta de cuidados paliativos.

“A Ciência tem sempre de mostrar que não desiste do ser humano e que nunca o abandona”, refere o especialista, na Casa de Saúde da Idanha (concelho de Sintra), das Irmãs Hospitaleiras.

O entrevistado contrapõe o discurso de uma alegada “dignidade da morte” à “indignidade da vida” de tantas pessoas, desde “reformas precárias, salários precários, estatuto de cuidador informal não reconhecido”.

“Tudo isso contribui para o sofrimento dos nossos utentes”, assinala Paulo Pina.

O responsável lamenta que cinco das dez camas contratualizadas com o Serviço Nacional de Saúde, na Unidade de Cuidados Paliativos, permaneçam vazias, faltando apoios aos doentes e cuidadores.

“Os doentes chegam em estádios muito avançados e é isso que nós lamentamos: temos quartos vagos, que estão notificados”, precisa.

Estas camas estão livres porque alguém está a ocupar uma cama de hospital que já não deveria”.

Para o especialista, neste processo, “falha muita coisa”, a começar pela falta de noção de “finitude” e de uma educação das pessoas “sobre as limitações”.

A Unidade de Cuidados Paliativos da Casa de Saúde da Idanha existe desde 2006 e um dos problemas que enfrenta, segundo Paulo Pina, é que “a referenciação ocorre muito tarde”.

A situação é mais difícil para os doentes, perante a falta de unidades de cuidados paliativos nos hospitais públicos da região de Lisboa.

“O sofrimento torna-se bem mais pesado quando eu não tenho promessas de algum tipo de atendimento”, indica o paliativista.

Paulo Pina diz que na Idanha existe uma equipa “treinada, formada” para ajudar doentes que, muitas vezes, chegam “desesperados” e “desmoralizados”.

Os doentes chegam com as suas angústias, neste caso uma angústia mais definitiva, a da sua terminalidade, porque sabem que têm doenças incuráveis e querem transitar pela vida o melhor possível”.

A equipa dos cuidados paliativos considera-se como “um manto que envolve as famílias” e os doentes em uma situação “crónica, progressiva, avançada”.

“A medicina paliativa é uma alternativa para pessoas vivas”, sustenta o entrevistado.

O objetivo não é vencer a doença, algo que contraria um sistema “triunfalista”, em que se diz que há “cura para tudo”; os paliativos são, muitas vezes, vistos como o “final do caminho” e não como um “parceiro”.

Segundo Paulo Pina, a medicina paliativa promove o “controlo sintomático”, não apenas de sintomas físicos, incluindo “o apoio social, espiritual, psicológico”.

Na unidade, há uma disponibilidade que os hospitais de agudos não têm, pela sua própria natureza.

“Cuidar do outro é atender ao tempo do outro”, indica o médico.

O Parlamento agendou para quinta-feira a discussão e votação de projetos do PS, BE, PAN, PEV e IL no sentido da despenalização da eutanásia.

SN/OC

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