Do Antigo Testamento a Bonifácio VIII, patriarca emérito de Lisboa conduz viagem à história destas celebrações
Lisboa, 05 dez 2024 (Ecclesia) – D. Manuel Clemente, patriarca emérito de Lisboa e especialista em história da Igreja, disse à Agência ECCLESIA que a celebração dos Jubileus, convocados pelos Papas desde 1300, nasceu por iniciativa “popular”.
“É muito interessante, porque a iniciativa é do povo, popular, a que depois a hierarquia correspondeu. É muito curioso isso”, indica, na primeira de uma série de conversas sobre a celebração dos jubileus, apontando ao Ano Santo de 2025.
As entrevistas vão ser emitidas semanalmente à quinta-feira, no Programa ECCLESIA, espaço televisivo da Igreja Católica (RTP2), ao qual o patriarca emérito regressa com um espaço dedicado à História.
“Esta série de programas vai ser sobre os jubileus, e foi também assim que começamos: em 98, a primeira série de programas foi sobre o Jubileu do Ano 2000, que se estava a aproximar”, recorda D. Manuel Clemente.
O Papa Bonifácio VIII instituiu, em 1300, o primeiro ano santo – com recorrência centenária, passando depois, segundo o modelo bíblico, cinquentenária e finalmente fixado de 25 em 25 anos.
“O jubileu não aparece como uma decisão, um plano arquitetado em Roma, concretamente pelo Papa da altura e pelos seus colaboradores. Não, vai ser uma surpresa, até vou chamar ao segundo programa desta série ‘a surpresa de Bonifácio VIII’, porque para ele foi surpreendente, e ele vai corresponder de maneira mais, digamos, organizada, sistemática, a isso que acontecia, àquelas multidões que ocorrem em Roma sem ninguém as ter convocado”, precisa o historiador.
Desde este primeiro jubileu, ligado a uma peregrinação a Roma, à visita aos túmulos dos apóstolos e outras práticas penitenciais, surge associada a indulgência.
“É um recomeço, agora no sentido espiritual, e é esta tradição que vai coincidir com a tradição bíblica do jubileu e dar origem aos jubileus que desde esse último ano do século XIII, que é o ano de 1300, até agora”, observa D. Manuel Clemente.
Há aqui uma confluência de motivos bíblicos e espirituais que levaram o povo de Deus, e, portanto, também dentro do povo de Deus, os Papas, a avançar com estas iniciativas, numa cadência que ao princípio era um pouco irregular, mas que depois se tornou regular destes 25 em 25 anos – além dos jubileus extraordinários”.
O patriarca emérito de Lisboa recorda as referências ao jubileu no Antigo Testamento, como acontece no Levítico [terceiro livro da Bíblia], que fala num “ano sabático”, de 7 em 7 anos, e o jubileu de 50 em 50 anos – “era assim chamado porque era anunciado por uma corneta, um chifre de carneiro, que se chamava ‘jobel’, portanto o jubileu”.
Segundo a prescrição contida no capítulo 25 do Livro do Levítico, de sete em sete semanas, no quinquagésimo ano, a “trombeta de aclamação” deveria soar para proclamar um “sábado” de 12 meses, durante o qual a terra devia descansar, as dívidas deviam ser perdoadas e os bens devolvidos à sua propriedade original, como explica uma nota divulgada pelo jornal do Vaticano, ‘L’Osservatore Romano’.
“O que se pretendia é que as coisas voltassem a ser como Deus as quer: que as terras voltassem aos seus possuidores, os que tinham ficado servos e escravizados, por esta ou por aquela razão, voltassem à liberdade, a própria terra ficava em pousio, tudo recomeçava. Era assim o ideal do jubileu”, indica D. Manuel Clemente.
“Não sei se alguma vez isso aconteceu ao longo do Antigo Testamento, os próprios biblistas têm muitas dúvidas, mas a ideia lá estava”, acrescenta.
O entrevistado sublinha que a pregação de Jesus Cristo assume este ideal indicando que “era Ele quem vinha realizar o jubileu”.
Na bula de proclamação do Jubileu 2025, intitulada ‘Spes non confundit’ (A esperança não desilude), Francisco anunciou solenemente o início e fim das celebrações do próximo Ano Santo, entre 28 de dezembro de 2024 e 6 de janeiro de 2026, naquele que será o 27.º jubileu ordinário da história da Igreja.
PR/OC