Ad Limina

Isabel Figueiredo, Diretora do Secretariado Nacional das Comunicações Sociais

Termina hoje mais uma visita ad limina dos Bispos Portugueses. Para quem consulta a Agência Ecclesia, foi possível acompanhar, dia a dia, o programa intenso de reuniões e encontros entre os Bispos Portugueses e as estruturas do Vaticano, incluindo um encontro com o Papa Francisco.  Sem grandes surpresas e, com exceção da Rádio Renascença e do seguimento à distância da Agência Lusa assim como da imprensa de inspiração cristã, a comunicação social portuguesa não manifestou qualquer interesse nesta visita dos Bispos Portugueses a Roma, apesar do trabalho da direção de Comunicação da CEP, que disponibilizou diariamente, informações, imagens e vídeos a todos os órgãos de comunicação social.

Na verdade, todas as atenções estão focadas nos candidatos às próximas eleições europeias, nos trabalhos da Assembleia da República, na atuação do Governo, na guerra no Médio Oriente e na guerra na Ucrânia. A ordem de interesse será mais ou menos esta e quase a podemos compreender. Digo “quase” porque nas semanas anteriores, muito de nós tivemos grandes dificuldades em entender o facto de termos sido inundados de notícias sobre os maus-tratos sofridos por uma pobre senhora, mas muito rica, assim como o de confirmamos até que ponto a falta de educação consegue ocupar mais espaço no nosso debate político, do que os problemas reais e urgentes do nosso país.

Por outro lado, já todos confirmámos que o tema Igreja só consegue “furar” os muros da indiferença mediática e social, quando estamos perante algo extraordinariamente bom, ou extraordinariamente mau. Temos exemplos recentes. A Jornada Mundial da Juventude teve as suas curvas de interesse mediático e culminou com uma relevância de atenção por parte da comunicação social, como raramente se tinha visto. Pelo contrário, tudo o que se relaciona com a questão dramática dos abusos de menores que envolvam a Igreja, ganha uma sempre nova atenção e dimensão. Neste caso, não está em causa a importância vital da nossa atenção a este drama. O que falta sempre é a capacidade de analisar o todo. A quem interessa o trabalho da Igreja nos bairros mais pobres e junto dos mais frágeis e abandonados? A quem interessa uma maioria de homens e mulheres que vivem em morrem sem qualquer motivo de escândalo, em paróquias, colégios, missões?

Nunca entendi o exercício da comunicação social que procura sempre, e em primeiro lugar, a denúncia do errado, do que está mal, do chocante. A construção de uma sociedade livre e democrática faz-se com as peças todas. Se assim não for, vamo-nos mergulhando num buraco onde de tudo se desconfia, onde a calúnia e a mentira e a desconfiança ocupam o pensamento e a validação de tudo o que nos rodeia.

Muito se fala e escreve sobre a atual falta de relevância da vivência da Fé Católica na sociedade atual. Dizem uns que a razão está no facto de não termos vozes que se imponham na análise da sociedade, de um modo concreto, na sociedade portuguesa. Dizem outros que a justificação se encontra no facto de que Portugal já não é um país maioritariamente católico, antes pelo contrário, os católicos são cada vez menos e cada vez mais velhos. E que se passa o mesmo com uma Europa envelhecida. Só mesmo em África ou na Ásia é que se consegue contrariar esta realidade. Dizem outros ainda que a culpa está na falta do saber comunicar das Igrejas particulares… as justificações são muitas, umas certas e assertivas, outras que servem propósitos estabelecidos.

Mas quase todos apontam uma exceção, a toda esta realidade: o Papa Francisco, uma das únicas, senão mesmo a única voz que o mundo escuta e respeita. E também aqui, se impõe a palavra “quase” … porque, dentro da Igreja, há quem desrespeite, desconsidere, despreze e desobedeça tranquilamente ao Papa Francisco.

Voltando ao início do texto: para quem dá a sua vida porque Acredita, para quem trabalha em comunicação da Igreja, claro que custa perceber que, em relação à visita ad limina      “não passa nada” como dizem os nossos irmãos da vizinha Espanha; claro que custa que a comunicação social – elemento essencial na defesa de uma sociedade livre e democrática, que procura e anuncia a verdade da atualidade – em relação à Igreja, manifeste um interesse atento e ativo pelo mal e pelo mau; claro que custa constatar que é dentro da Igreja que mais se critica aquele que tem conseguido falar de Jesus, da oração, da comunhão, do perdão, da paz, a toda a hora e a propósito de tudo.

Claro que sim. Mas também sabemos que aquilo que nos foi prometido nunca seria fácil: estar no mundo, sem ser do mundo… que ideia mais fora de todos os parâmetros do tempo e do mundo em que vivemos.

Uma “simples e rotineira” visita ad limina, esquecida na agitação dos dias, pode e deve trazer inquietações a todos, e de um modo particular  a quem trabalha em comunicação social, não no sentido de encontrar culpas, mas na essência da nossa Fé: a revelação da Ressurreição de Jesus é para chegar a todos.  A sua Igreja, que somos todos, assumiu essa missão há mais de dois mil anos e chegou até hoje. Como será o amanhã?

Isabel Figueiredo

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