Acolher a liberdade

Padre José Lima, Diocese de Viana do Castelo

Nos tempos remotos, o povo judeu saiu do Egito com o braço poderoso de Moisés; durante quarenta anos sofreu as dificuldades da travessia do deserto e, volvidas muitas peripécias e lamúrias, pode acampar em “terra de leite e mel”. Sofreu as agruras de uma vida nómada e plantou as suas tendas na Terra prometida.

Nos tempos mais próximos, no ambiente judeu, um homem nasceu de uma virgem judia e procurou acalentar a esperança deste mesmo povo, que séculos volvidos, ansiava por gerir a sua vida, longe de novos déspotas e sabia que só na confiança para com Deus um futuro lhe seria aberto. Jesus de Nazaré procurou dar alento aos judeus de sua época e escancarou para todos os povos uma era nova, longe de carestias e aberto ao manancial de Deus.

No tempo atual, povos de perto e de longe “esgravatam mínguas” para poderem sobreviver e alcançar uma terra onde possam viver decentemente e pensar num futuro mais humano, onde lhes assista o direito a uma terra, o benfazejo trabalho, as justas formas de lutar quotidianamente pela prosperidade. Com dificuldades, lutam contra usurpadores, mastigam sem querer lágrimas de fome e de guerra, estendem as mãos a um pedaço de terra, projetam um futuro sem bandeiras, tantos são os fautores do mal que deles se avizinham. Muitos fogem para terras mais aprazíveis, acolhedoras, que nem sempre comportam o que mais esperam, a tranquilidade, a honestidade, a coerência. Encontram por vezes exploradores, gente malvada que vende o mal com a capa de bem, exploram, espezinham, criam dependências maquiavélicas e pestíferas.

 

*** No antigamente, o povo foi orientado pelo Palavra que Moisés transmitia e com reticências acatava o que era eficiente; assim viu abrir-se o mar e engolir os perseguidores, cantou a terra firme que pisavam enquanto viam “sepultar no mar os cavalos e os cavaleiros” que os perseguiam.

No tempo de Jesus foi prometida a liberdade e abriu-se uma era nova para todos com o sangue derramado por um só. Assim Jesus tornou-se para os que nele acreditam, fonte de salvação, entregando vida nova “àqueles que jaziam nas sombras da morte”. A sua ressurreição é a nova porta aberta para todos os que acreditam no seu amor. A liberdade é oferecida.

Hoje há lampejos de luz nos caminhos tumultuosos dos homens, parecendo nascer um outro mundo sempre que o amor dá lugar ao perdão e os adversários se estendem as mãos. As clareiras ganham nova luminosidade sempre que há ensaios de honestidade, de benevolência, da dádiva, de amizade.

A liberdade assiste-nos, porque foi-nos oferecida.

A nós a tarefa de a acolher sem fingimento, de viver dela responsavelmente. Fomos chamados à liberdade, não para o erro e o mal, mas para a santidade no relacionamento humano. Não somos meros fantoches de outra vontade, mas ocupa-nos fazer a Sua vontade, por isso descobri-la e segui-la. Acolher a liberdade é o motete da Páscoa, somos libertos para libertar. Boa Páscoa.

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