25 de Abril: D. Manuel Clemente sublinha importância de lideranças católicas para normalização da vida democrática

Patriarca emérito apresentou obra lançada pela Agência ECCLESIA e Centro de Estudos da História Religiosa

Lisboa, 15 abr 2024 (Ecclesia) – O cardeal D. Manuel Clemente, patriarca emérito de Lisboa, sublinhou hoje a importância de lideranças católicas para a normalização da vida democrática no pós-25 de Abril.

“Não vai haver partido católico, vai haver católicos nos partidos”, observou, na apresentação do livro ‘25 de Abril: permanências, ruturas e recomposições’, publicado no âmbito das comemorações dos 50 anos da democracia em Portugal, com coordenação científica do Centro de Estudos de História Religiosa (CEHR) e edição da Agência ECCLESIA.

A publicação foi apresentada hoje, no Auditório Santuário de Fátima da Universidade Católica Portuguesa (UCP), em Lisboa.

O especialista em História da Igreja destacou a oposição “firme” do episcopado à criação de qualquer partido católico, no pós-revolução, posição que considerou “fundamental” para a afirmação de uma pluralidade democrática.

D. Manuel Clemente quis recordar a carta que 106 membros do clero de Lisboa entregaram na Nunciatura Apostólica, em 1967, pedindo que a escolha, na substituição do cardeal Cerejeira, recaísse sobre o então jovem bispo, D. Manuel Falcão, auxiliar do Patriarcado (que em 1974 seria nomeado coadjutor da Diocese de Beja), para afastar a Igreja portuguesa da “política governamental”.

O texto evocava a “isenção política” de D. Manuel Falcão, recordando que “muitos cristãos e alguns dos sectores mais vivos da sociedade portuguesa” se interrogavam “angustiadamente sobre o compromisso da Igreja” com o regime político.

O patriarca emérito destacou ainda a figura do futuro cardeal D. António Ribeiro, nomeado como sucessor de D. Manuel Gonçalves Cerejeira em maio de 1971.

A intervenção evocou acontecimentos como a Vigília pela Paz, organizada na Igreja de São Domingos em 1968, e a Vigília da Capela do Rato, de 1972.

“Estávamos claramente em fim de ciclo”, indicou D. Manuel Clemente, para quem este era o “sentimento geral”.

O responsável católico evocou a importância dos documentos do Concílio Vaticano II (1961-1965) e os pontificados de João XXIII e Paulo VI num momento em que o regime português começa a ser crescentemente contestado, quanto à sua política colonial.

“A pouco e pouco, as coisas vão mudando, também dentro do ambiente eclesial”, declarou o patriarca emérito.

D. Manuel Clemente apresentou uma leitura “pessoal” da sua vivência dos acontecimentos, como criança, no início da guerra, e como jovem de 25 anos, em 1974.

O livro assinala, num texto de Edgar Silva (CEHR), os “profundos impactos do magistério de Paulo VI em relação à guerra, na inequívoca condenação do colonialismo, nos compromissos em favor de uma cultura da paz, para a mudança da consciência católica em Portugal quanto à Guerra Colonial”.

A sessão contou ainda com a intervenção de Maria Inácia Rezola, comissária da Comissão Comemorativa 50 Anos 25 de Abril, que destacou a importância de preservar e “continuar a recolher” as memórias de quem viveu a revolução, em 1974.

“A Igreja e os católicos são uma peça importante na preparação e depois na construção da democracia”, apontou.

A historiadora afirmou que o 25 de Abril “tocou profundamente a Igreja, como todos reconhecem”.

O novo livro estrutura-se em torno de quatro temáticas fundamentais: “a Guerra, a Descolonização, a Democracia e o Desenvolvimento”.

A edição surge do trabalho desenvolvido no âmbito de um projeto de investigação do CEHR da Universidade Católica Portuguesa, “dedicado ao processo de transição democrática em Portugal”, abordando “diferentes questões em torno da religião, das práticas de fé, das convicções e dos seus diversos elementos e níveis institucionais e confessionais, atentando às permanências, ruturas e recomposições verificadas”.

OC

Peter Hanenberg, vice-reitor da UCP, deu as boas-vindas aos participantes na sessão, evocando a “aproximação de Portugal” à Europa e uma “certa normalização” do país, no contexto do continente, falando do 50.º aniversário do 25 de Abril como um “bom momento para festejar” o caminho percorrido.

Paulo Rocha, diretor da Agência ECCLESIA, falou do trabalho desenvolvido neste projeto, com o apoio da Comissão Episcopal responsável pelo setor dos media, para oferecer outros conteúdos ao público, “de forma mais profunda”.

Uma nova sessão de apresentação vai decorrer quarta-feira, pelas 16h00, na Torre dos Clérigos, com intervenções de Germano Silva, Virgílio Borges Pereira e D. Joaquim Dionísio, bispo auxiliar do Porto e membro da Comissão Episcopal da Cultura, Bens Culturais e Comunicações Sociais.

Rita Mendonça Leite, da equipa coordenadora da publicação do CEHR, sublinhou que os 20 artigos originais e uma entrevista apresentam ao público umag análise de “longa duração”.

A historiadora destacou a “grande diversidade” dos temas abordados, que continuam a ser “objeto de amplo debate”.

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