Sínodo 2024: Discernimento, escuta e reflexão podem levar a adaptações no Direito Canónico (c/ vídeo)

Alfreda Ferreira Fonseca e Octávio Carmo perspetivam a segunda sessão da XVI Assembleia Geral do Sínodo dos Bispos, marcada pela criação de comissões para refletir sobre alguns temas e a «transformação de modelo masculino e piramidal»

Lisboa, 30 set 2024 (Ecclesia) – O vaticanista Octávio Carmo afirmou que a reflexão da Assembleia do Sínodo dos Bispos, fruto do processo de discernimento, “não pode ser ignorada” e que terá de ser “o direito canónico a adaptar-se”.

“Isto é um longo trabalho de discussão e de reflexão. Portanto, quando se chega ao ponto, e isso está dito no instrumento de trabalho, quando há uma certeza fundada depois de um processo de discernimento e de escuta do povo de Deus, essa certeza não pode ser ignorada. Se aquilo que nestes anos todos, em determinados temas, se chegar ao fim desta segunda sessão com uma certeza que é preciso avançar nesse sentido, é o direito canónico que se tem de se adaptar e não ao contrário”, explicou o jornalista no programa ECCLESIA.

O vaticanista lembra que o Direito Canónico tem vindo a ser alterado desde 1983, adaptando-se “sucessivamente à realidade atual”.

Alfreda Ferreira Fonseca, que participou no debate e reflexão no processo sinodal numa comunidade, no patriarcado de Lisboa, explica haver experiências ilustrativas de uma Igreja católica onde uma “polifonia de vozes” se expressam “em comunhão, participação e missão da Igreja”.

“Ao longo do ano foram-se sentindo clivagens a Igreja é universal, católica, portanto, temos de aprender a viver com a diferença e penso que isso será alguma coisa que vai sair deste sínodo: em vez de ser uma única voz, vai ser uma polifonia de vozes que todas elas expressam a comunhão, a participação e a missão da Igreja”, indica.

Alfreda Ferreira Fonseca recorda haver experiências de “diaconato feminino” mas que “não têm visibilidade jurídica ou canónica”.

Octávio Carmo indica que a América Latina mostra a possibilidade de “organismos sinodais que não de natureza episcopal” mas “ligados ao ministério da presidência”: “A dimensão sinodal na Igreja não se esgota numa assembleia de Sinodal de Bispos, portanto, este trabalho tem de ser feito, e talvez estes grupos de trabalho possam ser um bom ponto de partida”.

Foto EPA/Lusa

“O Papa Francisco tem paulatinamente deixado claro que em determinadas temáticas e em demográficas é possível confiar responsabilidades ao episcopado e a organismos episcopais, até supranacionais, que não têm necessariamente de partir de Roma as decisões”, acrescenta o vaticanista.

Alfreda Ferreira Fonseca confessa ter “baixas expetativas” na segunda sessão da XVI Assembleia Geral do Sínodo dos Bispos, porque “uma parte do que as comunidades tinham pedido” passou para os grupos de trabalho e, sobre os grupos de trabalho, diz, “os resultados dos grupos de trabalho é um mistério”.

Octávio Carmo fala “num passo atrás” para se “perceber melhor o panorama”.

“O Papa quis levar os assuntos que são mais polémicos, que criam maior divisão para grupos específicos de debate e manter o sínodo sobre a sinodalidade fixado naquilo que é o seu tema. Houve uma reformulação do que se pretendia, o que não é mau. Aquilo especificamente que o Papa pretende para o sínodo, que é muito revolucionário ainda assim, que é uma forma como as comunidades católicas se veem a si próprias, como é que elas se veem no mundo e como é que se gerem internamente. Aqui sempre uma questão de poder e de relacionamento que é absolutamente fundamental e que vai ter consequências no futuro. Está bem, nós gostaríamos que tivesse consequências imediatas, mas pronto, isso tem tudo a ver com ajustes de expectativas, acho eu”, esclarece.

Alfreda constata que a “metodologia de escutar”, para além de se escutarem “bispos”, vai marcar o trabalho futuro dos grupos e da Igreja mas reconhece que a “tradição do clericalismo” é uma barreira.

“A transformação do modelo piramidal está a acontecer em algumas comunidades de base, simplesmente não está tão divulgado e tão difundido como o Papa desejaria, como alguns bispos desejariam. A formação nos seminários, a formação da Igreja Católica Romana é muito masculina e piramidal. Esbarra-se sempre com essa noção de que os leigos são ignorantes, as leigas mais ignorantes ainda, a falta de padres torna os leigos uns padres de segunda ainda mais clericais… É preciso uma mudança cultural”, sublinha.

A segunda sessão da XVI Assembleia Geral do Sínodo dos Bispos tem início no dia 2 e estende-se até ao dia 27 de outubro, com os 378 membros a refletir sobre a sinodalidade na Igreja católica.

A Conferência Episcopal Portuguesa está representada pelo seu presidente, D. José Ornelas, e por D. Virgílio Antunes, vice-presidente do organismo.

O cardeal Américo Aguiar vai participar na segunda sessão, por nomeação do Papa Francisco; já cardeal Tolentino Mendonça participa na sua condição de prefeito do Dicastério para a Cultura e Educação (Santa Sé).

Além dos quatro responsáveis portugueses, participam também nesta segunda sessão, 0  padre Miguel de Salis Amaral, docente da Universidade Pontifícia da Santa Cruz, em Roma, integrando o grupo de peritos (teólogos, facilitadores, comunicadores); o padre Paulo Terroso, da Arquidiocese de Braga, e Leopoldina Simões, assessora de imprensa, no grupo dos “assistentes e colaboradores”.

PR/LS

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