Economista contesta estratégias seguidas pelo país e sublinha papel das instituições católicas para evitar situação ainda mais «dramática»
Lisboa, 15 dez 2024 (Ecclesia) – João César das Neves, professor catedrático de Economia da Universidade Católica Portuguesa (UCP), considera que os responsáveis políticos desconhecem a “verdadeira pobreza” do país e elogia o papel da Igreja Católica, “principal ajuda dos pobres”.
“Um dos problemas que temos, daqueles que falam da pobreza, sobretudo nos gabinetes, é que estão a tratar uma pobreza que não existe. Não conhecem a verdadeira pobreza”, refere o convidado da entrevista semanal Ecclesia/Renascença, emitida e publicada aos domingos.
O docente universitário sustenta que a pobreza em Portugal “seria muito mais dramática” sem a ação da Igreja Católica e de várias suas instituições.
Para João César das Neves, o principal problema está no baixo nível dos salários, num sistema “bloqueado por leis laborais, bloqueado por impostos, bloqueado por interesses instalados”, afirmando mesmo que é “um mito” acreditar que subir o salário mínimo nacional (SMN) vai “resolver o problema”.
O entrevistado observa que o aumento do SMN tem vindo a “estrangular uma enorme quantidade de empresas” e de Instituições de Solidariedade Social.
“Esse é um dos casos mais típicos do mito de conseguir resolver o problema com uma lei, ainda por cima sem nenhuma despesa do Estado, porque o Estado não paga salários mínimos, quem paga são as empresas”, acrescenta.
O docente da UCP entende que a descida da taxa de pobreza dos idosos foi “um dos grandes sucessos” das políticas sociais, mas realça que representa um grande peso na despesa do Estado.
O impacto que as transferências sociais têm sobre a taxa de pobreza, em Portugal, é “dos mais baixos” da União Europeia.
“Estamos a gastar mal o dinheiro”, adverte o entrevistado.
João César das Neves fala da crise da habitação como um “problema estrutural”, que não é fácil de mudar.
“É um problema geral da sociedade portuguesa que depois cai numa pequena parte, mas talvez a mais visível, a mais escandalosa da pobreza, que é aquela que está sem casa, sequer sem teto”, observa.
A razão pela qual nós temos hoje, realmente, muito menos pobres do que tínhamos há 100 anos, não é porque o nosso combate à pobreza seja melhor do que há 100 anos, é porque nós estamos mais ricos do que há 100 anos”.
Questionado sobre as intervenções do Papa, o entrevistado considera que Francisco tem sublinhado que “o problema da pobreza não é um problema económico, não é um problema social, é propriamente um problema religioso”.
“Está sempre a falar na idolatria do bezerro de ouro, da idolatria do dinheiro, é um problema religioso, é o ídolo que nós pomos no centro da nossa sociedade. E isto é que é o ponto”, realça.
Autor de várias obras sobre o Natal, João César das Neves convida a imitar o olhar da Virgem Maria.
“A incompreensão de não haver lugar na hospedaria é a incompreensão que hoje encontramos nos centros comerciais, que encontramos em muitas consoadas e em muitas outras circunstâncias, e, no entanto, Ele nasce”, indica.
Para o economista, é essa esperança dada por Jesus a “única coisa” que pode salvar a humanidade.
“Também é isso que nós temos de dizer aos pobres. O que falta principalmente, nas nossas políticas de pobreza, é dizer aos pobres que eles são bem-aventurados”, conclui.
Henrique Cunha (Renascença) e Octávio Carmo (Ecclesia)