Portugal: «Principais efeitos da inflação incidem sobre a população mais pobre» – Carlos Farinha Rodrigues

Investigador sublinha importância de fazer do combate à pobreza um «desígnio nacional»

Foto: RR/Miguel Rato

Lisboa, 23 out 2022 (Ecclesia) – Carlos Farinha Rodrigues, professor do Instituto Superior de Economia e Gestão e especialista em desigualdades e pobreza, alertou para o impacto da inflação sobre a população mais desfavorecida, em Portugal.

“Os principais efeitos da inflação incidem muito sobre a população mais pobre”, alerta o investigador, convidado da entrevista semanal Ecclesia/Renascença, emitida e publicada ao domingo.

Os dados da Pordata para o Dia Internacional da Pobreza, assinalado esta segunda-feira, revelam que o número de pessoas em risco de pobreza ou de exclusão social aumentou 12,5% em 2020 comparativamente a 2019, a primeira subida desde 2014.

Farinha Rodrigues admite que, face ao aumento dos preços, algumas famílias se vejam obrigadas a escolher entre a alimentação e os medicamentos, reforçando a ideia de que “a inflação é, em si mesma, um fator de desigualdade”.

O especialista, um dos membros nomeados em 2020 pelo Governo para a Comissão de Coordenação para a elaboração da Estratégia Nacional de Combate à Pobreza, destaca que esta “trava o desenvolvimento económico” e coloca em causa os “valores democráticos” da sociedade.

“Só conseguimos resolver o problema da pobreza em Portugal se ele se tornar um fator mobilizador do conjunto da sociedade”, aponta.

O investigador acrescenta que o combate à pobreza não pode ser “exclusivamente” uma responsabilidade do Estado, mas um “desígnio nacional”.

Carlos Farinha Rodrigues assinala que, face ao atual cenário de incerteza, é mais urgente implementar uma estratégia de combate à pobreza.

“Nós tivemos a estratégia aprovada em dezembro do ano passado e só agora, com a nomeação da Drª. Sandra Araújo, temos condições para começar a implementar”, realça.

O entrevistado lamenta este atraso, considerando que o mesmo reduziu a “capacidade de criar sinergias, de olhar para o combate à pobreza de uma forma mais integrada, como ela exige”.

Para o professor do Instituto Superior de Economia e Gestão, um conjunto muito significativo de medidas de âmbito social que foram tomadas este ano ou contempladas no Orçamento 2023 estão no “espírito da estratégia”.

O combate à pobreza não se faz exclusivamente com políticas sociais, por mais importante que essas políticas sejam. Eu tenho de ser capaz de coordenar praticamente todo o universo das políticas públicas para o combate à pobreza”.

A entrevista identifica os problemas da habitação como “fulcrais na análise da pobreza”.

“O Governo decidiu face à atual crise, não permitir aumentos das rendas no próximo ano superiores a dois por cento. É uma medida com a qual concordo, mas já estamos a perceber que essa medida vai poder, potencialmente, ter efeitos perversos: a não renovação de contratos das famílias”, alerta.

Farinha Rodrigues critica ainda “a concentração de riqueza”, defendendo políticas para “largos setores da população que não estão na situação de pobreza, mas que sofrem os efeitos da crise”.

Para o especialista, o caminho passa pelo “reforço do Estado Social”.

“As consequências da pandemia seriam muito mais drásticas se nós não tivéssemos a intervenção do Estado”, recorda.

Henrique Cunha (Renascença) e Octávio Carmo (Ecclesia)

 

Partilhar:
Scroll to Top