Homilia do bispo de Viana do Castelo na celebração da Eucaristia da Vigília Pascal

«Porque buscais entre os mortos Aquele que está vivo? Não está aqui: ressuscitou». Esta mensagem dirigida àquelas mulheres que na saudade e no sofrimento tinham ido até ao sepulcro de Jesus de Nazaré e que as despertam para algo de novo e surpreendente, é a mesma que nos é dirigida a nós hoje que nos reunimos para escutar o grito de vitória de Jesus Cristo sobre a morte na experiência da Sua ressurreição. Na verdade Jesus Cristo ressuscitou, alegremo-nos e rejubilemos.

A riqueza da liturgia desta noite para nos ajudar a fazer a experiência do Ressuscitado e a Sua implicação na vida do baptizado e na vida da comunidade cristã, revela-se através da beleza da Palavra proclamada, percorrendo os passos significativos da história da salvação; expressa-se num conjunto de sinais nomeadamente da luz e da água baptismal; desafia-nos na profissão da verdadeira fé em Jesus Cristo; estimula-nos para a proclamação da Boa Nova da Ressurreição de Cristo.

Jesus Cristo é o Alfa e Omega de toda a criação, n’Ele se realizam as promessas feitas ao longo da primeira Aliança e Ele manifesta- Se como o Homem Novo para quem toda a criatura olha com o sentido de a Ele se configurar.

Como afirma o Papa Francisco, «a meta do caminho do universo situa-se na plenitude de Deus, que já foi alcançada por Cristo ressuscitado, fulcro da maturação universal» (LS, 83).  Na verdade, todas as criaturas «avançam, juntamente connosco e através de nós, para a meta comum, que é Deus, numa plenitude transcendente onde Cristo ressuscitado tudo abraça e ilumina» (LS, 83». Aliás, «o ser humano, dotado de inteligência e amor e atraído pela plenitude de Cristo, é chamado a reconduzir todas as criaturas ao seu Criador» (LS, 83).

Na Ressurreição de Cristo somos surpreendidos pela Nova Criação. De facto, «o Novo Testamento não nos fala só de Jesus terreno e da sua relação tão concreta e amorosa com o mundo; mostra-no-Lo também como ressuscitado e glorioso, presente em toda a criação com o seu domínio universal» (LS, 100). Como refere S. Paulo, «foi n’Ele que aprouve a Deus fazer habitar toda a plenitude e, por Ele e para Ele, reconciliar todas as coisas (…), tanto as que estão na terra como as que estão no céu» (Cl 1, 19-20).

Aliás, «isto lança-nos para o fim dos tempos, quando o Filho entregar ao Pai todas as coisas “a fim de que Deus seja tudo em todos” (1 Cor 15, 28)» (LS, 100).

Realmente, «as criaturas deste mundo já não nos aparecem como uma realidade meramente natural, porque o Ressuscitado as envolve misteriosamente e guia para um destino de plenitude» (LS, 100).

Mas é à luz do Ressuscitado que somos convidados a percorrer os passos da libertação do Povo de Deus na travessia do Mar Vermelho, porque este percurso histórico torna-se hoje definitivamente realizado em Cristo na passagem da escravidão do pecado e da morte para a Vida Nova de baptizados e discípulos.

Seguramente, que é na contemplação da água revigoradora que nos projecta na nossa condição de baptizados. Daí os sinais da luz e da água como manifestação de Jesus Cristo Ressuscitado que transforma a nossa existência e a nossa pessoa.

Como afirma S. Paulo à comunidade de Roma «todos nós que fomos baptizados em Jesus Cristo fomos baptizados na sua morte. Fomos sepultados com Ele pelo Baptismo na sua morte, para que, assim como Cristo ressuscitou dos mortos pela glória do Pai, também nós vivamos uma vida nova».

Não basta idealizar a ressurreição de Jesus Cristo como um acontecimento exterior, pelo contrário, a densidade e a profundidade do mistério que celebramos nesta noite pascal, lança a sua luz e a sua força transformadora sobre toda a história, sobre a mundo, sobre as aspirações e perplexidades do presente, mas sobretudo responde aos anseios de cada pessoa, convidando-a a passar do que os olhos vêm, do simples raciocínio humano, provavelmente do desespero, para escutar a voz quer nos alerta para a Ressurreição de Jesus Cristo.

Neste sentido, o itinerário que nos é apresentado no Evangelho é profundamente provocante e interpela-nos a percorrermo-lo nós hoje, pessoal e comunitariamente.

Tal como aquelas mulheres, também nós conhecemos a Jesus de Nazaré, na sua história, sabemos das maravilhas que Ele operou e os prodígios que os Seus gestos realizaram junto dos seus contemporâneos e somos informados da Sua morte trágica. Até aqui todos os que estão atentos à história sabem. Contudo, estas mulheres não ficaram por aqui. Também nós não podemos ficar tão só nesta dimensão da Sua vida.

Movidos pelos sentimentos de encontro que a Sua Palavra nos proporciona e pela acção do Espirito, o Amor derramado nos nossos corações, somos impelidos a ir ao encontro d’Aquele que tinha afirmado a Sua vitória sobre a morte.

Precisamente neste deslocarmo-nos e movidos pelo Amor colocarmo-nos disponíveis para que os sinais nos revelem o mais profundo da Revelação do Mistério, reconhecemos, então, que Ele não está ali. Aqueles sinais conduzem-nos à verdade da unidade entre o Jesus morto e o Ressuscitado, é o mesmo, mas Ele Ressuscitou, está Vivo.

Por isso, é muito oportuna e urgente a proclamação «porque buscais entre os mortos Aquele que está vivo? Não está aqui: ressuscitou».

Tanta gente que anda à procura de Jesus entre os mortos, mais ainda, que continua a procurar a sua salvação entre mortais, sem se alertar que o único que se revela com poder salvador é o Ressuscitado.

Diz-nos o texto Evangélico que aquelas mulheres foram narrar o que tinham visto e como se lhes tinha anunciado que Jesus estava vivo. Este anuncio provocou nos Apóstolos o desejo de fazerem também eles a mesma experiência.

Este movimento de anuncio e de encontro pessoal é fundamental na vivência do Ressuscitado na prática cristã. A missão de testemunho é essencial para a experiência da Ressurreição de Jesus Cristo.

De facto o anuncio da Ressurreição tão vivo na celebração desta noite implica a nossa condição de baptizados.

Somos chamados a percorrer os caminhos que levam ao encontro de Jesus Vivo, somos iluminados pela luz nova que nos faz descobrir a Sua Vida Nova de Ressuscitado a partir dos sinais da Sua morte e sentimos o estimulo a ser testemunhas da Sua Ressurreição junto de todos os que ainda aguardam por esta Boa Noticia.

É muito nítida a importância da comunidade para a verdadeira experiência de Jesus Cristo Ressuscitado. Ela é vivida em comunidade e é testemunhada em comunidade.

É oportuno o desafio do Papa Francisco lançado a toda a Igreja na edificação de comunidades de rosto sinodal, na comunhão, na participação de todos os baptizados e na missão partilhada por todos os fiéis em Cristo.

Hoje brota a esperança para todos os que esperam a sua libertação. Por isso, somos impelidos a tornar presente a Jesus Vivo, junto de todos os que O procuram, junto dos que desesperam por melhores condições de vida, pelos que se encontram mergulhados nas trevas e na morte, na tristeza, na solidão e na marginalidade.

Através de todos os discípulos de Jesus Cristo e de cada uma das comunidades cristãs, que hoje se sentem fortalecidas e iluminadas na sua fé, na sua esperança e na comunhão com Deus e com os irmãos, o os homens e mulheres, jovens e crianças, famílias, idosos, marginalizados e pobres são reconfortados na esperança.

Como afirma o Papa S. João Paulo II, «a tarefa fundamental da Igreja de todos os tempos e, de modo particular, do nosso, é a de dirigir o olhar do homem e de endereçar a consciência e experiência de toda a humanidade para o mistério de Cristo, de ajudar todos os homens a ter familiaridade com a profundidade da Redenção que se verifica em Cristo Jesus» (RH, 10). E continua, sublinhando que «simultaneamente, toca-se também a esfera mais profunda do homem, a esfera — queremos dizer — dos corações humanos, das consciências humanas e das vicissitudes humanas» (RH, 10).

Nestes sentimentos quero expressar os meus votos de Santa e Feliz Páscoa para todos os diocesanos, seja os que estão no nosso território sejam os que estão na diáspora. De modo especial rogo as bênçãos de Jesus Ressuscitado para todos os que se encontram em situações de dor, de sofrimento e de provação.

Imploro de Nossa Senhora que se alegra com a Ressurreição de Seu Filho, de S. Bartolomeu dos Mártires, de S. Teotónio e de S. Paulo VI, que nos abençoem e nos conduzam pelas sendas que levam à evangelização do mundo de hoje

Amen

D. João Lavrador, Bispo de Viana do Castelo

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