Homilia do bispo de Angra na celebração do Domingo de Páscoa 2019

         A palavra de Deus coloca perante nós três atitudes fundamentais para uma verdadeira experiência da Ressurreição de Jesus Cristo e, assim, podermos usufruir da graça do Ressuscitado que nos é oferecida no nosso Baptismo.

No itinerário descrito no Evangelho, no qual se manifesta o percurso percorrido pelos Apóstolos até se encontrarem com o sepulcro vazio, um deles que se adiantou, refere o texto Evangélico, «viu e acreditou»; já na primeira leitura dos Actos dos Apóstolos, na qual se dá noticia do discurso de Pedro à multidão, o qual após narrar alguns aspectos conhecidos da vida pública de Jesus de Nazaré e implicação de todo o povo na morte do Nazareno, proclama a Sua Ressurreição dizendo que «nós somos testemunhas de tudo o que Ele fez no país dos judeus e em Jerusalém; e eles mataram-n’O, suspendendo-O na cruz. Deus ressuscitou-O ao terceiro dia e permitiu-Lhe manifestar-Se, não a todo o povo, mas às testemunhas de antemão designadas por Deus, a nós que comemos e bebemos com Ele, depois de ter ressuscitado dos mortos».

Mais ainda, sublinha-se que «Jesus mandou-nos pregar ao povo e testemunhar que Ele foi constituído por Deus juiz dos vivos e dos mortos».

Por sua vez, S. Paulo, segundo o texto da segunda leitura, exorta a comunidade cristã dizendo que «se ressuscitastes com Cristo, aspirai às coisas do alto, onde está Cristo, sentado à direita de Deus. Afeiçoai-vos às coisas do alto e não às da terra».

Este itinerário que nos é proposto pela Palavra de Deus é fundamental para que a experiência da ressurreição de Jesus Cristo continue a realizar-se na comunidade cristã e em cada baptizado.

Conduzidos pela interpelação que nos vem de alguém que nos anuncia que Jesus Cristo está vivo, Ressuscitado, e que na Palavra, na Comunidade e nos Sacramentos é possível fazer a Sua experiência, despojando-nos dos nossos conceitos e preconceitos para darmos lugar à iniciativa divina que pela presença do Espirito Santo nos conduz à verdade total e entrelaça a nossa experiência pessoal com a vida de Cristo, e deste modo, podemos hoje continuar a dizer com o Apóstolo «vi e acreditei».

Por sua vez, aquele que «vê e acredita» torna-se em missionário desta Boa Nova, como testemunha dos factos que identificam a pessoa de Jesus de Nazaré e a luz nova que o faz reconhecer como Vivo e Ressuscitado.

Mas o testemunho só será credível se manifestar valores, critérios e opções novos. Se verdadeiramente peregrinos neste mundo e interessados em tudo o que são os dramas da humanidade, projectamos uma esperança nova que vem de quem vive não só confrontado pelo mundo mas com os olhos postos «nas coisas do alto».

Neste contexto lembramos as palavras do Concilio Vaticano II que referem que «constituído Senhor pela sua ressurreição, Cristo, a quem foi dado todo o poder no céu e na terra,  actua já pela força do Espírito Santo nos corações dos homens; não suscita neles apenas o desejo da vida futura, mas, por isso mesmo, anima, purifica e fortalece também aquelas generosas aspirações que levam a humanidade a tentar tornar a vida mais humana e a submeter para esse fim toda a terra» (GS. 38).

E, acrescenta, sublinhando que «sem dúvida, os dons do Espírito são diversos: enquanto chama alguns a darem claro testemunho do desejo da pátria celeste e a conservarem-no vivo no seio da família humana, chama outros a dedicarem-se ao serviço terreno dos homens, preparando com esta sua actividade como que a matéria do reino dos céus» (Ib. 38).

Na verdade, «liberta, porém, a todos, para que, deixando o amor próprio e empregando em favor da vida humana todas as energias terrenas, se lancem para o futuro, em que a humanidade se tornará oblação agradável a Deus» (Ib. 38).

De facto, mergulhados na experiência da Ressurreição de Jesus Cristo e captando a missão que dela nos atinge e compromete, reconhecemos que «procurando o seu fim salvífico, a Igreja não se limita a comunicar ao homem a vida divina; espalha sobre todo o mundo os reflexos da sua luz, sobretudo enquanto cura e eleva a dignidade da pessoa humana, consolida a coesão da sociedade e dá um sentido mais profundo à quotidiana actividade dos homens» (Ib., 40).

Aliás, «a Igreja pensa, assim, que por meio de cada um dos seus membros e por toda a sua comunidade, muito pode ajudar para tornar mais humana a família dos homens e a sua história» (Ib., 40).

Celebrar a Ressurreição de Jesus Cristo implica da parte de toda a comunidade cristã e de cada baptizado assumirem a missão de testemunhar, pela palavra e sobretudo com gestos libertadores, a mesma vida de Jesus Cristo.

Este é o dia para lançarmos o olhar para o nosso mundo, para a nossa sociedade e para a nossa cultura e escutar o clamor de tantos homens e mulheres que atingidos pelos sinais de morte, procuram uma vida autenticamente digna do ser humano.

A Ressurreição e a Vida Nova presente na vida dos baptizados não é uma teoria, muito pelo contrário, é verdadeiramente uma prática,  de modo que colocando a esperança nos bens futuros se aplicam afincadamente na transformação do mundo actual.

Buscar os Sinais do Reino de Deus, desenvolvê-los e torná-los patentes para que atraiam e sirvam de apoio seguro para a humanidade de hoje, eis o nosso compromisso.

O caminho que nos leva ao encontro de Jesus Cristo vivo e ressuscitado é o mesmo caminho que nos leva ao encontro dos irmãos para os fazer sair das trevas da sua ignorância, da teimosia da sua soberba, da arrogância do seu egoísmo, e oferecer a docilidade do caminho do amor, do despojamento e da partilha aberto pela Ressurreição de Jesus Cristo.

Há um mundo novo que se abre através da Ressurreição, no qual é possível fazer desaparecer a exclusão, a miséria, a ignorância, a violência, as trevas da inteligência, a ausência de Deus e a autorreferencialidade para desabrochar a alegria e o amor, a paz e a partilha comunitária, a comunhão com Deus e com os irmãos.

Celebrar a Ressurreição de Jesus Cristo é fundamental para que cada comunidade cristã viva e partilhe a missão com frescura, esperança, vitalidade e entusiasmo. Deste modo, damos expressão ao lema da nossa diocese para este ano: «comunidade evangelizada em comunhão missionária».

Façamos com que a Ressurreição de Jesus Cristo atinja a todos e em todos os lugares.

Imploro de Nossa Senhora, Mãe e Rainha dos Açores, que se alegrou com a ressurreição do Seu Filho que lance o Seu olhar e a Sua bênção sobre todos os nossos diocesanos, famílias, idosos, criança, jovens, emigrados, prisioneiros, doentes, excluídos cultural, social e religiosamente e todos os que se sentem destituídos da sua dignidade humana e nos encaminhe pelas sendas da evangelização do mundo de hoje.

Amen.

D. João Lavrador, Bispo de Angra e Ilhas dos Açores

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