Fátima: Mostrar a realidade «escondida» das pessoas com deficiência e perceber-se acompanhado (c/vídeo)

Semana de férias para pais e pessoas com deficiência acontece há 14 edições num convite ao descanso, empatia, convívio e festa

Foto: Silenciosos Operários da Cruz

Fátima, 23 jul 2022 (Ecclesia) – A semana de férias para pessoas com deficiência e para os seus pais, na casa dos Silenciosos Operários da Cruz, em Fátima, mostra uma realidade escondida, gera encontros de partilha e faz os pais descansar.

“Quando aqui cheguei deparei-me com um mundo diferente. Esta é a realidade que lá fora não se vê. As pessoas escondem porque têm vergonha do que o vizinho possa dizer”, lamenta Maria José Silva à Agência ECCLESIA.

Acompanhada da filha Ana João, que em 2009, sofreu um aneurisma, Maria José chega da Trofa, todos os anos desde que em 2016 conheceu esta proposta.

“Eu gosto muito de vir a Fátima e a Ana gosta muito também. Em casa ela já não consegue comer há mesa, mas aqui ela senta-se e permanece. Ela gosta de tudo: dói-lhe a cabeça mas sente-se muito alegre por estar no meio de todos, a cantar e a bater palmas. Mesmo que eu não gostasse, eu vinha com ela pelo prazer que isto lhe dá”, conta.

Esta é uma semana de cumplicidade totalmente dedicada a esta sua filha: “Esta semana é para mim de descanso, completamente dedicada a ela, e ela sabe que me tem para ela. Saio daqui descansada e chego a casa com outra cara. É mesmo verdade”.

Em casa ficou a mãe da Elsa Alexandre a descansar, aproveitando que a sua filha com 34 anos, gosta muito de participar na semana de férias e vem sempre que pode.

“Gosto de vir a esta casa porque fazemos uma festa, convivemos. Quem está em casa sozinho, aqui sente-se com alegria e assim dou descanso à minha mãe”, conta esta jovem à Agência ECCLESIA.

Foto: Silenciosos Operários da Cruz

Elsa conhece o Centro de Espiritualidade Francisco e Jacinta Marto há 25 anos e lamenta que durante o ano passe tanto tempo em casa; das várias semanas de férias que já ali passou elege a “ida à praia das Rocas”, mas garante que gosta de tudo.

“Todos os anos conheço pessoas novas, era bom que viessem mais para conhecerem mais a casa e eu arranjar mais amigos. As festas são boas para arejar a cabeça”, explica.

A voluntária Carmo Coimbra participa nesta iniciativa há 13 edições.

“Tem de haver uma certa vocação. Eu vim, sinto-me bem e gosto. Crio amizades, porque numa semana criam-se ligações, ficamos a conhecer-nos melhor”, conta a servita à Agência ECCLESIA.

A pandemia fez interromper esta iniciativa dos Silenciosos Operários da Cruz e do Santuário de Fátima, que acontece desde 2006, e em cada ano as inscrições multiplicam-se, o que levou a que esta 14ª edição disponibilizasse cinco turnos, até 31 de agosto.

“As pessoas precisam de conhecer outros – passam o seu ano entre instituição e casa e sair é uma alegria. Durante uma semana passam por atividades lúdicas e espirituais. As pessoas com deficiência são muito espirituais. Têm limitações mas desenvolvem outras capacidades e formas de expressão. Alguns pais ficam para acompanhar os seus filhos: alguns acham que ninguém cuida dos seus filhos como eles, alguns ficam para poder estar com outros pais em partilha, conhecem outros casos”, explica a voluntária Carmo Coimbra.

Foto: Silenciosos Operários da Cruz

O programa propõe atividades dentro do Centro para os jovens que se inscrevem e momentos de partilha entre os pais que desejam permanecer naquela semana junto dos filhos, sendo ajudados por uma equipa de voluntários que 24 horas por dia está disponível para ajudar.

Adriana Abreu, chega de Setúbal, vai entrar no 4º ano de medicina e foi, como diz, a fazer «scroll» nas redes sociais que conheceu a proposta para fazer voluntariado durante uma semana com pessoas com deficiência – em dois minutos decidiu inscrever-se.

“Porque não dispor de uma semana das minhas férias para me por ao serviço? Um dos grandes desafios do Evangelho é saber caminhar ao lado, tal como Jesus fazia, quando olhava para os outros lado a lado. É um desafio poder ser assim”, conta a jovem de 22 anos à Agência ECCLESIA.

A futura médica lamenta que o “estigma” sobre a pessoa com deficiência persista e espera que, “na primeira pessoa”, possa contribuir para “um mecanismo de mudança social”.

“É muito importante estar aberto a quem vem ter connosco. Se formos boas pessoas, seremos bons profissionais. Nestes dias tenho descoberto a necessidade de amar e ser amado, de partilhar e contar histórias, partilhar a natureza humana, o que somos”, conta.

Foto: Silenciosos Operários da Cruz

A acompanhar os jovens durante a semana, a irmã Marta Couto explica que na casa dos Silenciosos Operários da Cruz, o sofrimento ganha outra dimensão.

“As pessoas com deficiência ensinam a simplicidade. No meio de tantas coisas que achamos que precisamos, aqui percebemos que precisamos pouco. A palavra é algo desnecessário. Muitos dos jovens que aqui estão não falam, a comunicação verbal é difícil, mas se nos calarmos exteriormente e entramos em contacto com a pessoa, ela comunica connosco e mostra-nos muito mais. Têm uma grande capacidade de comunicação, têm uma grande sensibilidade”, regista a leiga consagrada.

«Vem para o Meio» é a proposta que vai conduzir os cinco turnos desta 14ª edição, que decorre no Centro de Espiritualidade Francisco e Jacinta Marto, em Fátima.

LS

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