Ecumenismo: Diálogo entre cristãos tem de concretizar-se nas «grandes causas» da «justiça, paz, direitos humanos e ecologia» – padre Tony Neves

Coordenador do Gabinete de Justiça e Paz dos Missionários do Espírito Santo valoriza «guia» do Vaticano para criação de equipas ecuménicas nas comunidades católicas

Lisboa, 18 jan 2021 (Ecclesia) – O padre Tony Neves, coordenador do Gabinete de Justiça e Paz dos Missionários do Espírito Santo, afirmou que o caminho ecuménico deve acontecer nas “grandes causas”, da “justiça, paz e os direitos humanos, as questões ecológicas”.

“Na minha opinião, a par da oração, esse é o caminho ecuménico mais percorrido e mais interessante. E o que se diz a nível ecuménico, diz-se no diálogo inter-religioso. Falamos de oração, pela prática comum da caridade, pelo empenho em grandes causas: a justiça, a paz e os direitos humanos, a integridade da criação, as questões ecológicas são uma boa plataforma ecuménica”, indica à Agência ECCLESIA o missionário espiritano, numa conversa a emitir esta noite, na Antena 1.

Com uma larga experiência de encontro ecuménico, não só enquanto missionário “pelo mundo fora”, mas a trabalhar em diferentes áreas na congregação a que pertence e agora em Roma, no Gabinete de Justiça e Paz, o padre Tony Neves multiplica o olhar de unidade por áreas onde o ser humano é o centro.

Falo como missionário: temos pelo mundo fora, um conjunto de missões, onde a situação, no plano humanitário, social, político, económico é de tal maneira grave que os católicos se juntam a protestantes, ortodoxos, mesmo a muçulmanos, a crentes de outras religiões, a pessoas que se dizem agnósticos que lutam por valores humanos, e sendo humanos, são profundamente cristãos”.

O responsável reconhece o “caminho a ser feito”, sem diminuir as dificuldades e a “ilusão” de uma unidade imediata: “temos gente profundamente ecuménica, que acredita que a vontade de Cristo de comunhão perfeita é perfeitamente realizável, se empenha e compromete com iniciativas para que isso aconteça, mas temos muita gente que se entrincheira – «A minha igreja tem 100% de verdade, os outros se quiserem venham cá ter connosco, eles estão errados e nós temos a certeza toda».”

O padre Tony Neves recorda a “experiência de uma semana intensa”, na Roménia, onde na Assembleia Ecuménica Europeia, pode acompanhar “partilhas de cristãos de todas as Igrejas cristãs, protestantes e ortodoxos”, onde, reconhece, realizou a “experiência mais radical de uma vontade comum de unidade e da riqueza da diversidade”.

O Vaticano publicou a 4 de dezembro de 2020 um “guia prático” para bispos, com indicações para o diálogo entre comunidades cristãs e sobre a participação na vida sacramental, em particular a Comunhão.

“O compromisso ecuménico do bispo não é uma dimensão opcional do seu ministério, mas um dever e uma obrigação”, pode ler-se no ‘vade-mécum ecuménico’ intitulado ‘O bispo e a unidade dos cristãos’, um texto aprovado pelo Papa.

“É um documento corajoso, porque pega na caminhada que se fez a partir do Concilio, e indica que cada Conferencia Episcopal, diocese, de preferência, cada paróquia e instituto de vida religiosa, devia ter alguém encarregue de coordenar a pastoral da unidade, se possível ter uma equipa ecuménica para trabalhar em parceria com outras Igrejas; diz também que todos os cursos de Teologia devem ter uma cadeira de ecumenismo, e os seminaristas devem passar pela experiência ecuménica durante a sua formação”, aponta o padre Tony Neves.

O entrevistado afirma que só passando por uma experiência ecuménica “concreta” se pode continuar a valorizar esse trabalho, caso contrário, “fica-se com algumas ideias ecuménicas na cabeça”, que depois desaparecem “sem consequência”.

“A preocupação do dicastério da Unidade, ao propor concretamente todas estas orientações, parte da conclusão que há muita gente que não liga nada a isto. E não havendo compromisso depois não há mais nada”, lamenta.

O caminho ecuménico na Igreja Católica teve um momento de referência no Concílio Vaticano II (1962-1965), num itinerário que já havia sido iniciado pelas Igrejas protestantes.

“A Igreja Católica foi aderindo progressivamente mas é algo muito recente. As feridas tão profundas não cicatrizam sem um longo caminho de discernimento, de confiança mútua que é preciso reganhar, porque se perdeu ao longo dos séculos e, sobretudo, ver por onde estes caminhos de unidade podem ser palmilhados”, assinala o religioso português.

O programa Ecclesia na Antena 1 vai esta semana centrar-se em testemunhos de religiosos colocam o diálogo ecuménico e inter-religioso na sua ação missionária e apostólica.

LS/OC

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